
A lavadeira (Cora Coralina)
Data 21/04/2014 12:56:28 | Tópico: Poemas -> Dedicatória
|  Essa Mulher... Tosca.Sentada. Alheada... Braços cansados Descansando nos joelhos... olhar parado, vago, perdida no seu mundo de trouxas e espuma de sabão - é a lavadeira. Mãos rudes, deformadas. Roupa molhada. Dedos curtos. Unhas enrugadas. Córneas. Unheiros doloridos passaram, marcaram. No anular, um círculo metálico barato, memorial. Seu olhar distante, parado no tempo. À sua volta - uma espumarada branca de sabão Inda o dia vem longe na casa de Deus Nosso Senhor o primeiro varal de roupa festeja o sol que vai subindo. vestindo o quaradouro de cores multicores Essa mulher tem quarentanos de lavadeira. Doze filhos crescidos e crescendo. Viúva, naturalmente. Tranqüila, exata, corajosa. Temente dos castigos do céu. Enrodilhada no seu mundo pobre. Madrugadeira. Salva a aurora. Espera pelo sol. Abre os portais do dia entre trouxas e barrelas. Sonha calada. Enquanto a filharada cresce trabalham suas mãos pesadas. Seu mundo se resume na vasca, no gramado. No arame e prendedores. Na tina d’água. De noite – o ferro de engomar. Vai lavando. Vai levando. Levantando doze filhos Crescendo devagar, enrodilhada no seu mundo pobre, dentro de uma espumarada branca de sabão. Às lavadeiras do Rio Vermelho da minha terra, faço deste pequeno poema meu altar de ofertas.
Cora Coralina (1889-1985), poetisa goiana, In: Poemas dos Becos de Goiás e Estórias Mais, Editora Global.
Imagem: Ponte Langlois em Arles e as lavadeiras pintura de 1888, Vincent Van Gogh.
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