
Verde Turvo (Parte II) - Árvore dá vida.
Data 29/05/2014 01:50:29 | Tópico: Poemas
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Volto às luzes de outro ontem mais longe, mais perto. Também há árvores da mesma espécie que fotografei outrora com os olhos de vidro e feitiço que a tecnologia deu.
A espécie da semente em forma de barco de navegar mares de gramas e terra onde caem. Castanhas pratos a servir periquitos desequilibrados, também verdes, gritando agradecidos.
Ou ofendem as árvores? São dos boatos e pios os pássaros, falou-me outra vez um azul.
São contadores de notícias às árvores que os esperam plantadas.
Um passarinho me contou tudo isso no dia em que disfarcei-me árvore. Tal como o cão, o pássaro reconheceu o engôdo, mas a memória do pássaro não era urina.
A memória do pássaro é alimentar-se e alimentar a árvore de notícias dos céus.
Foram as andorinhas que contaram às árvores da semente de barco sobre mim e meu disfarce. Como seu eu fugisse do sumo dos frutos que planto.
Se há pranto? Claro. E tantos, escuros, escusos... Tentam apagar-me e apego-me a eles.
Logo de árvore, lagos de água, quase dissolvo-me em pranto. Chovo choro.
Porém, estando árvore ou pretendendo-me mais clorofila, lembro que o choro, chuva do céu de mim, é sempre sede de nós, verdes.
Se acho a chuva pranto fico rígido como este poema-árvore e escorro-me em lava, chuva.
A lava que atravessa-me tronco também desconfia do tato. A minha pele mais fina, impossivelmente casca, dividindo dentro e fora de mim.
Dentro é outro universo. Feito da mesma coisa? Feito da mesma matéria mole, suposta matéria prima de poeta? Feito de dores?
O que há dentro da árvore além da seiva?
Sei-o, por fazer-me ser. Sou seiva na selva dessa aurora na contemplação dos ipês.
Enfim, as flores. Não digam que não falei de flores.
Há um ipê alaranjado enfeitiçando a mangueira dos cachos de fruta santa.
O ipê enfeitiça mangueira com a linguagem das árvores que é a mesma dos ventos e dos pássaros.
Aliás, o vento é a música que árvores dançam com seus ventres de árvores.
Falar mesmo, só os pássaros, contadores de notícias que a todos dão psiu.
Psilocibina é um cogumelo. Coisas quase árvores, só que azuis.
Não os quero, nem em chá. Melhor deixar pra lá e divagar que as anacardiáceas dançam ao sabiá que o ipê não enfeitiça nada.
O ipê é o próprio feitiço das árvores.
Árvores quase azuis, psicodélicas, querem além do verde turvo. Fazem nuvem de ipês e forjam neve. Tilintam folhas verdes em riso tácito de folhas, moçoilas bailarinas de vento e riso.
Ri ri ri Todas elas, anacardiáceas feiticeiras. De tanto disfarçar-me árvore e fingir-me aceito, passo a saber coisas das raízes. Entro dendro, dentro da árvore, dentro de mim (a mesma coisa), aprendi a introspecção botânica ou a dendrospecção.
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