Rasga-me

Data 29/01/2008 23:23:17 | Tópico: Poemas

Naval o tempo e o verbo
em que Catrinetas passadas cruzaram o nosso olhar
e em mim, redondas, as tuas mãos maiores, desejaram-se
ambiciosas no naufragar.

[Eram tuas as searas e as luas com que vesti o firmamento,
o azul das estradas assoladas, desmedidas, desaguadas
por sobre planícies e mar…]

Da vigia do teu barco em riste, olhas-me a medo,
e Dezembro tomba e já desliza no Janeiro das coisas renovadas,
- amendoeiras em flor -, de que, qual submissa moura,
olvidada nalgum lugar, se vestem minhas vestes cerzidas
em tons de mágoa, engalanadas na dor pérola d’alabastro.

Rasga-me
das neblinas marítimas deste tempo,
bebe o azul retinto do mar alto e parte saciado,
ébrio sem fim, amado - ainda que por esta noite madrugada -,
na hora apátrida em que poesia toma conta de mim e,
ausente dos homens e das flores(1),
estremeço na sensualidade enigmática dos astros.

(1) Ausente dos homens e das flores, in Sibilam Pedras na Encosta, Ed. Corpos 2007 (da autora)



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