Sinergia

Data 23/10/2014 08:35:11 | Tópico: Crónicas

Os ócios em clara denúncia despontam o lado abstruso de minha percepção. Eu era fato, eu era tato, eu era são. Eu era, de fato, um estranho velho desconhecido ensaiando infidos sorrisos de fronte para o espelho. A água tórrida do banho me abrangeu e eu desejei ser parte dela; ser diluído; ser transparente; escorrer pelo ralo (...)
Cambaleei pelo corredor estreito até o quarto com o olhar na direção dos pés, impelindo meus restos mortais sem qualquer sinergia. Era tarde da noite, o quarto estava escuro e a mente, vazia. As pálpebras cansadas, o corpo descuidosamente abandonado em leito, uma terrível amnésia vindo à tona e minh’alma vagarosamente se esvaindo.
Logo desejei transformar em palavras escritas cada pensamento errante de minha cabeça. Mas não havia papel, não havia caneta, não havia mão. Não havia nem mesmo cabeça. Não havia nada que pudesse chamar de meu. Destarte, já não era uma questão de possuir, mas de ser. Não era mais. (Não era o que?) Não era eu.
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A alvorada declara sua apatia em degradé, manifestando-se em tons abrasadores de um novo ciclo. Nenhuma cor, nenhuma dor, era plausível de ser sentida, admirada, respectivamente. E nenhum raio de Sol era convincente o bastante para se fazer entender que todo o valor não jaz na perda, e sim, no recomeço.
Com a face abrigada entre um cobertor negro e penas finas de ganso ou outra ave qualquer, o estranho partiu, rumo à outra dimensão. Se entregou nos braços de Morpheu e então, sucumbiu.



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