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O dia ensolarado abre a vidraça. Acaba a graça do sono sem os afagos de lua. A mãe abandona e o pai cuida, porém, mais áspero, mais seco, mais dia. O dia irrompe meus delírios de continuidade. O fluxo é visível somente à luz do sol. A noite é sempre terna, eterna, felina e parda para toda gente, sobretudo aos poetas - que se deitam, depois do sexo com a poesia e os derramamentos das seivas que a poesia exige, depois dos tropeços e levantes, depois de todos os risos e bater de copos e de dentes, depois de tanta lua... Deitam-se, e ao dormirem, pensam secretamente na morte. Não aquela derradeira, a tal caveira matreira que hora ou outra há de chegar com a foice. Foi-se este medo. É imaginação de morte, sem medo. É imaginação de morte, sem morte, é só ensaio da imaginação. É que o poeta ao despertar do dia, sente saudade - que aperta - da noite de alegrias fugidias e passadas. O poeta tem medo da poesia ficar desgastada, estagnada na parede da memória, tornar-se um quadro pendurado lá mas que ninguém olha. O poeta teme o distanciamento das musas que são em sua maioria, noturnas. O que move o poeta depois da chegada do sol é manter-se desperto com o rosto perto do tempo esperando a outra noite chegar. Quando escreve ao dia, o poeta, não faz mais que recordar, ter saudades da noite, pra onde espera voltar. Antes do sol, ainda antes da morte sem morte da noite, o sono vem com um cantar: - Amanhã, outra noite será, da mais pura alegria que se possa imaginar.
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