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 O INQUILINO DOS SONHOSData 15/03/2015 23:21:50 | Tópico: Poemas
 
 |  | CarlosAlexandreNascimento 
 
 O INQUILINO
 DOS
 SONHOS
 
 
 CAPÍTULOS
 
 CAMUNDONGO TINHOSO
 A COBRA EMPLUMADA
 O DUELO
 O BAU ESCONDIDO
 A INVESTIGAÇÃO
 O DESPERTAR
 
 
 
 CAMUNDONGO TINHOSO
 
 Desolado em terror ante insano tormento
 Na fissura que fende o caminho adentro
 Toma posse o inquilino franqueado destino
 Sobre o grito cortante do pavor repentino.
 
 No assoalho gelado corre o olho vidrado
 Vespertino momento de um acaso em descaso
 Instalado em oculto no quarto fechado
 Rota fuga ele traça pela fresta encontrada.
 
 -Que há outra vez? Ecoa o sussurro
 No ouvir do barulho desassossego noturno
 
 -não é nada de novo
 Camundongo tinhoso
 -De volta pro ninho
 -Com seu queijo gostoso
 
 Na madrugada furtada do semblante caído
 Pelo sono perdido em seu sonho acordada
 E a vontade eminente em anseio ardente
 Lesa as mãos inocente desenfreado sabor.
 
 Repelente incrimina sua mente assassina
 Sufocando o prazer questionando o comer;
 
 -O que fazes de novo, em tal habito faltoso?
 -Que é isso que vejo descontrolada em desejos?
 -Não é nada de novo torrãozinho gostoso
 -Um docinho roubado da Zezé do mercado.
 
 Começou aos pouquinhos por um simples ratinho
 Em seu sonho acordada. E então sorrateira
 Em tamanha leveza transformou-se em gata.
 
 Torrãozinho docinho, um vintém no cofrinho
 Mente descontrolada. Seu prazer é furtar
 Possuída está, em seu gosto de ladra.
 
 Por vulgar emoção, de seu lenço de seda
 Mascarada beleza dupla face se faz
 Escondendo seu rosto com luvas frias nas mãos
 Sem digital no caminho perfeito é o crime
 Litígio é religião.
 
 A vizinhança sabia, em madrugada acordada
 Não tinha porta trancada que não pudesse entrar
 Só um pedacinho de queijo pra abrandar seus desejos
 No sussurrar de seu nome: Felina vem degustar.
 
 
 
 
 
 
 
 A COBRA EMPLUMADA
 
 No quarto vizinho ao lado, a voz que balbuciava ao fundo
 Silêncio profundo se fez. Já em alta madrugada
 Por traz da mobília pesada ela sonha outra vez.
 
 Repelente o movimento é sagaz
 Emplumada a víbora é dengosa
 De olhar sedutor bem vulgar
 E enroscando-se maliciosa
 Esconde-se fria a serpente maldosa.
 
 -Que é isso que vejo em ti
 -Extravagante em vermelho tão cedo assim
 -Produzida e muito maquiada
 -Parecendo uma cobra emplumada?
 
 -Meu batom, tem fisgada certeira
 -E o olhar sedutor da paixão
 -Cascavelo por cima do salto
 -Ao encontro de muita emoção.
 
 
 Pobre Irmã de Felina, cujo nome de profissão
 Era Lola, de muitos amores
 Muitos sonhos perdidos em prisões
 
 Assediada desde menina
 Pelo tonto do seu meio irmão
 Cometendo incestos terríveis
 Cresce Lola vinda do sertão.
 
 Criou-se por entre as vielas
 De uma tão perigosa favela
 Já tão cedo expulsa de casa
 Prostituta, cobra emplumada.
 
 A paixão cambaleava de amores
 Questionando o porquê da razão
 Com seu copo escoando de vinho
 De pileque morre seu meio irmão.
 
 Zé ruela apelido era herdado
 Costurando os butecos no escuro
 Com seu pai lampião de porteiras
 Nos gargalos perdidos do mundo.
 
 O DUELO
 
 No terreiro de fulano Audencio
 O pau d’água chefe de casa
 Havia um cupinzeiro vazio
 Que em forno de lenha fora transformado
 
 Fazendo broa quentinha, tapioca pra Lola levada
 Porem já em alta tardinha, deitado no calor das brasas
 O exercito sai de mancinho, cupinzeiro pra dentro de casa.
 
 Já vesgo pela bebida, sonhando meio que acordado
 Sua cama desmancha aos pouquinhos
 Cupinzeiro fazendo desgraça.
 
 O criado também ta brocado
 Feito em pó pelo bicho danado
 Só sobraram as ferrugens da sala
 Espingarda de sal carregada.
 
 O cupim era muito guloso
 Comia toda mobília do tolo
 Até mesmo as calçolas de Audencio
 Que pelado fugia correndo.
 
 Foi então que tudo começou, quando sua cachaça passou
 Acordado do sono indolente, seu compadre pra briga chamou
 Com sua cartucheira nas costas, o sertão ele atravessou.
 
 O compadre de audencio era o preto
 Chocolate de muitos desejos
 Trovador das modinhas nas noites
 Sua sanfona escondia segredos.
 
 Era muito chegado de casa
 A comadre foi sua namorada
 Eles tinham um caso antigo
 Que ficou muito mal resolvido.
 
 Ela sempre fazia questão
 De dançar na festa do baião
 Uma moda com o preto apertado
 Que deixava Audencio irado.
 
 
 Muita gente já desconfiava
 Que o caçula era filho da farra
 Era o preto quando criança
 No trazer de suas lembranças
 
 Quando o sol no sertão se escondia
 Um assobio ao vento se ouvia:
 - Eu começo esse refrão
 -Batendo forte no pandeiro
 -Pra dizer a ti compadre
 -Vai cantar em outro terreiro.
 
 -Minha sanfona é dengosa
 -Me acompanha nessa prosa
 -Pra deixar o meu recado
 -Vosmecê nunca foi galo.
 
 -Meu gogo é afiado
 -Diferente do seu papo
 -Minha espora mete medo
 -Vai capar os teus segredos.
 
 -Tenho dó da Joaninha
 
 -Ela sempre quis ser minha
 -E esquecer tanto desgosto
 -Pois tu sempre foste um frouxo.
 
 -Meu jardim já ta florido
 -Muitos filhos eu reguei
 -Diferente do compadre
 -Que perdeu a sua fez.
 
 -É ai que tu se engana
 -O caçula da Joana
 -Tem a cor de chocolate
 -E já chora com a sanfona.
 
 Quando Audencio o acorde ouviu
 Seu pandeiro explodiu
 Deixando o povo assustado
 Pois o homem era bravo.
 
 Muito vesgo de nascença
 Via tudo embaçado
 Mas agora estava cego
 Pra vingar àquele agravo.
 
 Só um tiro atravessou
 A sanfona que tocou
 No velório da Joana
 Que caída ali ficou.
 
 Já o Preto assustado
 Com o destino inesperado
 Morre ao lado da comadre
 Pela bala que sobrou.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 O BAU ESCONDIDO
 
 Clandestina a luz é vermelha
 De programa a dona do salão
 Cafetina guardava segredos
 Emplumada Lola do sertão
 
 Foi chegando amuadinha
 De barriga na jardineira
 Ganhou a vida se vendendo
 Cafetina sertaneja
 
 Quando soube da noticia
 Muito se entristeceu
 -Mala pronta to de volta
 -Com meu filho Zé Dirceu
 
 Ele era bem fresquinho
 De sapato amarelinho
 
 Rebolava feito cobra
 Chacoalhando o sapatinho
 
 Um barulho no escuro
 Da gaiola que dormia
 A gatinha da felina
 Fim da pena ela cumpria
 
 Era tudo tão normal
 Tudo muito casual
 Insensível e criminosa
 A apatia dessa ladra
 Só fez dela um chacal
 
 Pensamento de vingança
 Muito sangue das lembranças
 
 Era quase endeusada
 Regougando a turba em massa
 Da matilha em direção
 Na mente só rebelião
 
 Corre um papo de cadeia
 Que um baú ela escondeu
 Enterrando no terreiro
 Do fulano que morreu
 
 Naquela época antiga
 O defunto era sepultado no seu lar
 Foi cavando que se viu
 Uma peça milenar
 
 Um baú bem enterrado
 Um mistério revelado
 De uma vida criminosa
 Muitos anos de um passado
 
 Em sorrisos de emoção
 Um tesouro escondido
 Pensamentos tão perdidos
 Muitos sonhos desvendados
 De grandes decepções
 
 Bem no fundo uma peça;
 -Ratoeira que desgraça
 -Isso aqui não faz sentido
 -Felina sempre foi sarcástica
 
 A gatinha entendeu
 Bem depois que ela cresceu
 Todo aquele aparato
 Pra pegar tinhoso rato
 
 -Que é isso escondido
 -Se explique sem chilique
 Gritou Lola decepcionada
 Querendo toda a grana roubada
 
 -Não é nada de tão novo
 -asqueroso camundongo tinhoso
 -com seu queijo a passar
 
 -Ainda me lembro bem cedo
 -No despertar dos desejos
 -Da tão pequena criança
 
 -O vai e vem roedor
 -Roubando sonhos de amor
 -De uma doce esperança
 
 -E no despertar instigado
 
 -Instinto insano aflorado
 -Transformei-me na ladra que sou
 
 -Em meio a uma madrugada
 -Filhinha fique acordada
 -Mamãe no quarto entrou
 
 -Pra afugentar teus fantasmas
 -E abrandar esse carma
 -A ratoeira te dou
 
 -Mas eu gostava daquilo, sentia até calafrio
 -minha mente ele roubou, ficando só um vazio
 -Ao enterrar o martírio, armadilha pro tentador
 
 Acusadora a serpente, de língua dobre e ardente
 Inflama a situação; - mamãe sempre dizia,
 -Que tu não escaparias das grades daquela prisão.
 -E agora ta arrependida, chorando as suas feridas
 -Sem mascara de lenço na mão.
 
 -Pois saiba que eu também já sonhei
 -Com uma serpente emplumada
 
 -Que um ovo em minha mente botou
 -Fisgando minha alma excitada
 -Chocando daquela malvada
 -Devaneios lascivos de amor.
 
 -Um dia mamãe assustada
 -Ouvindo o chocalho dentro de casa
 -Um carvalho na porta cravou
 
 -E pra liberar o antídoto
 -Pro veneno da cobra maldito
 -Ao Dono da madeira clamou:
 
 -Ó senhor que a cruz carregou
 -Aplacando todo mal e a dor
 -Cura todas as nossas feridas
 -Pelo teu sangue mui redentor
 
 -Mas eu nunca gostei de clamar
 -Na boemia escolhi ficar
 -To de volta pra vida noturna
 - Prefiro esse ovo sempre chocar
 
 
 O rapaz de sapato amarelo, vendo toda situação
 Carabina de sal carregou e perdido saiu pro sertão
 Sendo herdeiro de um lampião, os legados de um avô beberão
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 A INVESTIGAÇÃO
 
 E por onde anda o pai dessa casa
 Que destino será que lhe deu?
 
 Em muitos anos de fuga escondido, vencido pelos tormentos surrados
 Em consciência nos sonhos acordado, resolvi então escrever
 Pra contar uma historia de gloria, que um dia deixei de viver
 
 O cupinzeiro velho amigo
 Transformado em forno de lenha
 Ensinou-me um triste caminho
 Um destino jamais esquecido
 
 Em meus sonhos meio acordado
 Comeu toda mobília da casa
 Só restando pra minha desgraça
 Cartucheira de sal carregada
 
 
 Começou pela minha gatinha
 Influencia do mal infiltrada
 Furtando seus sonhos tão lindos
 Transformando sua vida em ladra
 
 Ele sempre foi um ladrão
 Assassino homicida e cão
 Quando entra no coração
 Causa grande destruição
 
 Rouba tudo que vê no caminho,
 Impondo sentimentos de desdém tão frios
 Uma vida sem mais amores, só maldade e muitos rancores
 Restando apenas fria prisão, de uma mente em escuridão
 
 O inimigo sagaz e voraz
 Não satisfeito com tal destruição
 Cascavela por cima do salto
 Na menina mudança de habito
 
 Ela perde todo desejo
 De boneca e também de brinquedo
 Assediada por seu meio irmão
 Cresce Lola de muitos desejos
 
 Destruindo no seio familiar
 Separações de muitos casais
 Instrumento de grande promiscuidade
 É inimiga de toda verdade
 
 O menino é herdeiro de tudo
 Salpicando o sertão de amarelo
 Emplumado desfila de carro
 Cafetão é um bofe engomado
 
 As rameiras estão sempre com ele
 Faz lembrar sua mãe tão guerreira
 No inicio ganhando a vida
 Explorando todas as raparigas
 
 Essa parte é a mais dolorosa
 Zé ruela era o filho da prosa
 Ele era mesmo bastardo
 Porem um filho muito amado
 
 Sua mente sempre foi viciada
 Na bebida e na Irmã desejada
 Sempre abria a porteira dos segredos
 Nos gargalos perdido em desejos
 
 Ele disse um dia exaltado:
 -Eu te vi de sorriso engraçado
 -Com a tia Zezé do mercado
 -Em caricias deixando-me hesitado
 
 -Foi então que me apaixonei
 -Pela minha irmã que amei
 -Ao seguir teu exemplo maldoso
 -Das cachaças do fundo do poço
 
 Investigada foi minha vida
 Em lençóis maculados de dor
 Nesta nodoa perdi pro compadre
 A Joana meu grande amor
 
 Ela era meu caju do sertão
 Sua pele macia e dourada
 Aveludada igual rosa perfumada
 Desmanchou-se em pétalas de solidão
 
 Sobrancelhas curvadas ela tinha
 Revelando sua linda expressão
 
 Em alegres tons de aventura
 Sintonia do amor e paixão
 
 As maças do seu rosto diziam
 Em contraste com seus lábios molhados
 Quando vermelhos de vergonha ficavam
 Desejando deveras ser beijados
 
 Seus olhos de jabuticaba
 Negros como as noites sem lua
 Conjugava com seus sedosos cabelos
 Pelas lágrimas perdidas entre os dedos
 No seu sangue aflorado em vermelho
 
 Tudo isso o inimigo roubou
 Feito um cupinzeiro destruidor
 Quando ele entra bem de mancinho
 Dentro de casa tem sempre um ninho
 
 Corrompendo a virtude e valores, feito traça e também roedores
 Fermentando o veneno escorrido, nas raízes ao ramo perdido
 Enroscando sua presa em necrose, de serpentes hipnose na mente
 
 É preciso fechar essa porta e a tranca de toda entrada
 Sempre atento as frestas abertas, para nunca deixar descoberta
 A entrada do bicho danado, que enferruja a mente do desocupado
 Da razão tira todo saber, transformando todo seu viver
 
 Insensível traição é normal
 Sem pudor tudo é tão casual
 Permissivo e promiscuo é o sentir
 Triste vida desse mundo aqui
 
 Pelos crimes liberto estou
 Pelos anos que já se passou
 Minha mente presa está
 Ao perdão sem poder conquistar
 
 Despeço-me entre tão poucas linhas
 E endereço a quem possa desejar
 Sobre o som da sanfona do Zé
 Companheiro que veio me buscar
 
 
 
 
 
 
 
 O DESPERTAR
 
 Mal o galo havia cantado, gritou sua irmã a Zezé;
 -Joaninha acorda mulher...  O Audencio está feito um leão
 -destruindo o forno com o enxadão
 
 Quando ela chegou de repente, o alambique de água ardente
 Encontrava-se todo quebrado com o Audencio pegando o rato
 Lambuzado amassando o barro
 -Que é isso? Gritou a Joana
 
 -Vou tampar toda fenda da casa
 -Espingarda já está carregada
 -Pra matar essa cobra danada
 
 Duas bonecas feitas de palha
 Alegravam Maria e Marta
 Quando Audencio calafetava
 As crianças de corda pulavam
 
 
 Joaninha não mais agüentou
 Assustada seu filho ganhou
 Gestação era de grande risco
 Prematuro Zé Dirceu chorou
 
 A festança estava preparada
 Com modinha de dança arrumada
 A sanfona chorava afiada
 E o labrador de nome; preto, uivava
 
 Com um sorriso estampado no rosto
 Despertado e muito aliviado
 Audencio percebe que o sonho
 Era mesmo sinal enviado
 
 Ele nunca gostou de sermão
 Oração coisa de desocupado
 Criticava os fieis aos domingos
 Que corriam do preto zangado
 
 A Joana não acreditava
 Vendo o homem em retórica elevada
 Discursando a respeito da vida
 
 E como da cachaça transformado fora em graça
 
 Era sempre o primeiro a louvar
 Melodia a Deus entoar
 Da família cuidava com amor
 Sendo sempre um pai exemplar
 
 Nunca mais ele olhou pra Zezé
 Sempre sóbrio estava de pé
 A espingarda ele abandonou
 Uma cruz de carvalho comprou
 
 Quando a cobra vinha sorrateira
 Com veneno de morte cruel
 Ao senhor do carvalho clamava
 Com o olhar sempre fito ao céu:
 
 -Ó Senhor que habita nas alturas
 -Que a serpente na cruz já venceu
 -Proteja minha família amada
 -Do veneno maldito e cruel
 
 Assim a cobra fugia
 Querendo um ninho sempre encontrar
 Nas vergas em cima das portas
 Nas frestas da casa entrar.
 
 
 
 
 FIM
 
 
 
 
 
 
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