Hino à Beleza (Charles Baudelaire)
Data 16/03/2015 02:17:23 | Tópico: Poemas
| Virás do céu profundo ou surges do abismo, Beleza? O teu olhar, infernal e divino, Gera confusamente o crime e o heroísmo, E podemos, por isso, comparar-te ao vinho.
Conténs no teu olhar o poente e a aurora; Expandes os teus odores qual noite de trovoada; Teus beijos são um filtro e uma ânfora, a boca Tornando o herói covarde e a criança arrojada.
Vens da treva mais negra ou descerás dos astros? Encantado, o Destino é um cão que te segue; Semeias ao acaso alegrias, desastres, E por dominares tudo é que nada te interessa.
Caminhas sobre os mortos, que são o teu gozo; Das tuas joias, o Horror é das que mais fascina, E entre tais enfeites, o próprio Assassino, Vai dançando feliz no teu ventre orgulhoso.
O inseto, deslumbrado, procura-te a chama, Arde crepita e diz: Benzamos esta Luz! O apaixonado trêmulo, aos pés da sua dama, Parece um moribundo a afagar o sepulcro.
Mas que venhas do céu ou do inferno, que importa, Beleza! Monstro ingênuo, assustador, excessivo! Se o teu olhar, teus pés, teu riso, abrem a porta De um Infinito que amo e nunca conheci?
De Satanás ou de Deus, que importa? Anjo ou Sereia, Se tu tornas – ó fada de olhos de veludo, Ritmo, perfume, luz, ó rainha perfeita! – Mais leve cada instante e menos feio o mundo? Charles Baudelaire, poema traduzido por Fernando Pinto do Amaral.
|
|