O rei vaidoso e o sábio que não mentia
Data 23/09/2015 13:55:08 | Tópico: Poemas
| Pedindo a sua atenção Para a minha poesia Faço voltar o passado Por meio de analogia Contando O rei vaidoso E o sábio que não mentia
É a história de um rei Que era muito vaidoso E só sabia ouvir O discurso elogioso Declamando poesias Se julgava talentoso
Baruki foi esse rei Que só ouvia louvores Sempre vivia cercado De grandes bajuladores Que ele não tolerava Juízos opositores
Quando ele reunia No salão palaciano Figuras da sua corte Do jovem ao veterano Tudo ia aplaudir Os versos do soberano
Ninguém ousava dizer Que na sua monarquia Era preciso limpar A mancha da tirania Porque ele abusava Da sua soberania
Mas havia no seu reino Um sábio de qualidade Quando era consultado Só dizia a verdade E nunca ia ao salão Bajular a majestade
De todos sábios do reino Ele era o mais letrado Farid por seus colegas Era sempre consultado Não deixava sem resposta O que fosse perguntado
Um dia o velho Farid Preparando seu almoço Na beira de uma estrada Misturava um caldo grosso Cozinhando com legumes Belos pedaços de osso
O conselheiro do rei Que prezava ostentação E desprezava o sábio Por não ser um cortesão Passava pelo caminho Trotando num alazão
Quando avistou Farid Com a sopa na panela E viu o sábio atiçando O fogo embaixo dela Parando aquele cavalo Foi abrindo a goela:
- Farid, quando você Por nosso rei for ouvido E der para a majestade O elogio devido Nunca mais irá comer Desse caldeirão cozido!
Aquelas palavras eram Cheias de puro desdém Por ser um homem exato Que a honradez mantém Mexendo no ensopado Farid falou também:
- Kedari, quando você Uma sopa der valor Sabendo apreciar Seu verdadeiro sabor Nunca mais irá ficar Na corte desse opressor!
Ouvindo aquela resposta Kedari enraiveceu: - Esse Farid não tem Mais virtude do que eu E um dia irá louvar O rei no seu apogeu!
Então esse conselheiro Usando de sutileza Falou assim com o rei: - O valor de Vossa Alteza Já é muito conhecido Em toda a redondeza!
Vosso estro de poeta É por todos estimado Só falta avaliação Do nosso maior letrado Farid precisa estar No palácio convidado
Aceitando essa idéia O governante real Na primeira ocasião Enviou um serviçal Que foi convidar Farid Para um grande sarau
A corte foi reunida No salão palaciano Pra uma declamação Do poeta soberano E até a vassalagem Foi ouvir o suserano
O palácio foi tomado Por nobreza e fidalguia Confiante o monarca Declamava a poesia Ecoavam nas paredes Os aplausos nesse dia
Farid foi ao palácio Somente por convidado Mas não viu nenhum um valor No que era declamado Não faria os elogios Nem que fosse obrigado
Disse o rei: - Quero ouvir Do grande estudioso Se meu talento merece O discurso elogioso Diga a sua opinião Que já estou ansioso!
Disse Farid: - Meu rei, Isso não é poesia Tenho que desconfiar Que sua aristocracia O elogio lhe dá Por medo da tirania!
No salão palaciano A surpresa foi geral Tudo esperava louvor Ao governante real Como era o costume Daquele tempo feudal
Baruki ficou furioso Com esta declaração Deu ordens para levarem Farid para a prisão Dizendo o dia exato Da sua condenação
Os soldados o levaram Para dentro da cadeia Que além de ser escura Era muito suja e feia Com uma cama estragada Toda coberta de teia
Os amigos de Farid Apelando ao soberano disseram que a sentença Era um grande engano Mas nenhum soube fazer Baruki mudar o plano
Os dias foram passando Com o sábio prisioneiro Sabendo que a prisão Era o leito derradeiro Por causa da esparrela Feita pelo conselheiro
Preciso agora falar Do mancebo Martinez O aluno mais leal De todos que o sábio fez Ensinando a andar Na trilha da honradez
Voltando de uma viagem Chegou nesse povoado Esse jovem aprendiz Que trazia um recado Sem saber que o seu mestre Estava aprisionado
Como não o encontrava Perguntou a um plebeu: - O sábio vive nas ruas O que foi que aconteceu? - Ele está num calabouço Mais escuro que o breu!
- Por ter dito a verdade O rei deu a punição Se desse a mesma pena Pra quem faz bajulação De nobres e cavaleiros Ficava cheia a prisão!
O aprendiz foi procurar Seu mestre no cativeiro Que já tinha até ficado Amigo do carcereiro Como havia urgência Deu a notícia ligeiro:
- Meu mestre, você precisa Ir visitar o seu pai Que já ameaça dar O seu derradeiro ai E para baixo da terra Num instante ele vai!
- Martinez, agora mesmo Vá ao rei pedir licença Pra que eu possa ser levado Hoje em sua presença Pois eu quero lhe pedir Que mude a minha sentença!
Martinez ao soberano Foi fazer o seu pedido Explicando que o sábio Precisava ser ouvido O monarca aceitou Que ali fosse trazido
O sábio foi escutado Numa breve audiência: - Farid, o que vai querer da minha benevolência? - Um indulto especial Peço a Vossa Excelência!
O meu pai adoentado Preciso ir visitar Mas voltarei à prisão Minha palavra vou dar Na minha sinceridade O rei pode confiar!
- Quem disse que eu confio Na sua sinceridade? Quem tem o conhecimento Nem sempre diz a verdade Você nem reconheceu O estro da majestade!
Os seus amigos vieram Sua soltura pedir Quem sabe se não estão Querendo me iludir Inventando um pretexto Para ver você fugir?
O sábio já esperava Por aquela altivez Já sabia que o rei Manteria a rigidez Entendendo o motivo Uma proposta lhe fez:
- Posso fazer a viagem Pelos guardas escoltado Com poucos dias depois Nós já teremos voltado E naquela enxovia Continuo aprisionado!
- Os guardas vão com você Por uma deserta estrada Os seus amigos esperam Pra fazer a emboscada Fico desmoralizado E a tropa humilhada!
Todo povo vai dizer Que o rei foi enganado E pelo sábio do reino Um dia foi insultado Desprezando uma sentença Depois de ter escapado
- Eu espero por clemência Que venha de Vossa Alteza! Palavras duras falei Perante sua nobreza E o monarca preferiu Rejeitar minha franqueza!
O soberano negou Seu pedido de clemência Mas o jovem Martinez Reconhecendo a urgência Fez ao rei uma proposta Porque tinha consciência:
- Farid sai da cadeia Pra fazer sua viagem Eu fico no seu lugar Na escura carceragem É a vossa garantia Que viaja sem vantagem!
No dia do enforcamento Se ele não tiver voltado Diante de todo povo Aceito ser enforcado Se o rei tinha razão Isso ficará provado!
- Se é o que você quer Aceito a sua proposta Mas lembrando ao aprendiz Que ela não foi imposta Querendo correr o risco O sim é minha resposta!
E naquela mesma noite Farid teve soltura Montado em um cavalo Partiu para a lonjura Deixando o seu aprendiz Naquela cadeia escura
O desfecho da história Todo povo esperava Mas o jovem Martinez No retorno confiava Pois sabia que o mestre Sua palavra honrava
Passada uma semana Esgotado foi o prazo O rei disse ao aprendiz: - Não tolero o atraso A minha ordem é lei Não aceito o descaso!
O monarca ordenou Imediato cumprimento Na praça da execução Foi grande o ajuntamento Toda cidade foi ver O triste acontecimento
O aprendiz de Farid Foi levado ao cadafalso Foi tido por inocente E o seu mestre por falso Só o moço atribuía O atraso a um percalço
Quando o carrasco botou A corda no seu pescoço O povo todo gritava No meio do alvoroço: - O sábio devia estar No lugar daquele moço!
O rei com a sua corte Assistia da tribuna E os vassalos no pátio Alinhados em coluna O conselheiro julgava A sentença oportuna
De repente aconteceu Uma estranha agitação Era o sábio que chegava No meio da multidão Gritando para o carrasco: - Parem a execução!
Subindo ao cadafalso Disse quase num abalo: - Vim na estrada cavalgando Até morrer meu cavalo E mesmo um velho não tem A destreza de um vassalo!
Depois um carro me trouxe Até o meio do caminho E o restante do trajeto Tive que fazer sozinho Andando apressadamente Evitando o remoinho
Foi essa dificuldade O motivo da demora Nunca pensei em trair A esse jovem que chora Pra cumprir a minha pena Eu me apresento agora!
Diante daquele fato O povo se comoveu Tudo pedia clemência Do vassalo ao plebeu Exigindo a soltura De Farid ao rei seu
O rei disse: - Este sábio Deu provas de ser honrado Voltando da liberdade Pra salvar o condenado Igual a um criminoso Não pode ser condenado
Ordenando a prisão Reconheço que errei Ele tem os seus alunos Para ensinar em toda grei Hoje volta para as ruas Com a permissão do rei!
Depois que o rei falou Recebeu aplaudimento E desse dia em diante Sem nenhum impedimento Ao sábio foi permitido Expressar o pensamento
O sábio fez seu mister Com honra e sabedoria Agora chegou a vez Do leitor da poesia Que paga pelo folheto Uma pequena quantia
FIM
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