
OVIEDO
Data 02/10/2015 07:00:48 | Tópico: Poemas
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recordo-me era março e a noite tinha pousado a sua manta sobre o corpo da cidade deitando sobre a mesma gambiarras de sonhos e silêncios de caminhos traçados sobre a ardósia por onde se registram os meus passos de aprendiz de poeta moldador de palavras a noite abre-se à música das sombras dos reclamos luminosos do coro que ancestrais pedras encantam
dentro do coração do olhar desperto para o mundo e tal como no poema do piquero somente frio a rua (1) prometia mas como não sair e não habitar rostos que se perdem em cada bar em cada esquina rostos que connosco partilham o fracasso como norma da casa aqui ou noutro lugar qualquer porque o homem desconhece tudo o que há para além do seu umbigo
e assim vamos por onde a companhia a que se senta sempre à nossa mesa é sempre a nossa própria solidão como se os nossos passos fossem guiados pela mão do abandono e perguntamos pela sorte das cinzas destes dias que vento as leva ou traz para a memória que alimenta o poema que se escreve o poema que serve de catarse unguento que se aplica nas feridas
da alma mesmo sabendo que não sara mas talvez este absinto sare aqueça esqueça a noite a mesa onde se senta a nossa companhia a solidão e já não sendo março em oviedo e o poema adormeça entre as palavras essas que são a essência do seu ser permanece a promessa do abandono de nos levar de volta para a ausência
Xavier Zarco
Notas: (1) PIQUERO, José Luis – Noche de Marzo. In “Escrito en el agua – Revista de Literatura”, n.º 2, Oviedo, Espanha, 1989, p. 20.
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