A malvada madrasta

Data 12/10/2015 16:03:18 | Tópico: Textos -> Tristeza


Vivia um homem numa aldeia ao sul da Manágua, que casara duas mulheres, ambas geraram duas lindas meninas. O marido era comerciante, quando viajava em questões de negócios, levava uma das mulheres e outra ficava à tomar conta das filhas e da casa. O comerciante não ficava muito tempo na aldeia, viajava constantemente e sempre que partia fazia-se acompanhar da mesma mulher. A outra, descontente por causa de pouca atenção que o marido lhe dava, descarregava sua irra na filha da companheira; quando eles partiam, punha a filha da acompanhante fazer todos os trabalhos de casa, enquanto a que gerou nada fazia.
Na aldeia havia uma fonte, onde os aldeões iam buscar água, mas só no período de manhã, à tarde, a partir do meio-dia, era a vez das fadas. E era nesse momento que a mulher ciumenta obrigava a filha da viajante ir buscar água, a coitadinha não podia rejeitar, pois levava surra, ia chorando pelo caminho, carregada dum pote que excedia seu peso, chorava com medo de ser molestada ou morta por fadas más, que iam buscar água à aquela hora. Porém, nada acontecia.
A menina nunca informara à mãe nem ao pai do que se passava, pois fora ameaçada de morte pela madrasta, caso ousasse contar. O castigo se repetia sempre que a mãe se ausentasse.
Uma bela tarde, à hora das fadas na fonte, a infeliz menina de sete anos, carregada do maior pote da casa, ia chorando a caminho da fonte ladeada de densa floresta, a escassos metros da nascente que jorrava água cristalina, encontrou-se com uma fada, das boas, que lhe perguntara:
-filha, porque vem buscar água a esta hora?
-minha mãe se ausentou e minha madrasta obriga-me vir a esta hora!- responde a menina entre soluços e lágrimas.
-não chore, filha!-roga a boa fada, enxugando-lhe lágrimas.
Encaminhou a menina à fonte, deu-lhe banho, que não tomara há meio ano, concedeu-lhe dom e forças para carregar o pote que pesava meia tonelada.
Uma vez em casa, a madrasta lhe perguntara porque atrasara na fonte, ao responder-lhe, brotou da sua boca pétalas de rosas perfumadas, que atraíram à atenção de todos os aldeões que passaram a venerá-la como uma santa.
A menina contou para madrasta como tudo aconteceu. Inconformada com a veneração dos aldeões, resolveu mandar a sua própria filha, à mesma hora e carregada do mesmo pote, porém a menina não ia chorando, ia cantando a caminho da fonte. A poucos metros da nascente, encontrou-se com uma velha (fada disfarçada) que lhe perguntara:
-filha, porque vem catar água a esta hora?
-vim a esta hora porque quis, e quem és tu, velha porca, pra mo perguntar?-responde a menina da mamã e sem esperar pela resposta, dirigiu-se à fonte, encheu o pote e foi para casa. À porta esperava-lhe a mãe toda ansiosa…
-que tal minha querida filha!?
Ao tentar responder à mãe, soltaram-se da sua boca sapos e cobras, a mãe fugiu. Os aldeões reuniram-se e lincharam a menina.
A mãe desesperada atribuiu culpa à afilhada. No calar da noite, amarrou-lhe os braços e enterrou-a viva no jardim.
Passaram-se meses e ninguém soube do paradeiro da menina das rosas. Uma bela manhã, um jardineiro estava arranjar o jardim, agarrou num tufo de capim e quando se preparava para cortar, ouviu uma voz que cantarolava:
-jardineiro do meu pai
-não corte o meu cabelo
-minha mãe me penteou
-e minha madrasta me enterrou
Atónito, o pobre jardineiro largou o tufo de capim e pôs-se à olhar dum lado e doutro com intuito de vislumbrar o lugar donde vinha aquela penosa canção, porém nada enxergava. Voltou à agarrar no tufo de capim e quando estava prestes a cortar, ouviu de novo aquela canção vinda debaixo da terra, largou a tesoura e desenterrou a menina. Reuniu os aldeões e a menina contou como tudo acontecera, mandaram informar os pais que regressaram à pressa à aldeia.
A madrasta má tentou defender-se das acusações, mas acabou por ser amarrada ao jipe e arrastada pelas ruas da aldeia até morrer.
Hoje, se aceitares meu convite, levá-lo-ei a passear pelas ruas da Manágua, onde respiraremos o fedor da carne putrefacta da madrasta má.

Adelino Gomes-nhaca



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