
O apito da fábrica de papel (AjAraujo)
Data 01/11/2015 01:43:15 | Tópico: Poemas -> Saudade
|  “ Precisamos sempre mudar, renovarmo-nos, rejuvenescer; caso contrário, endurecemos. Devemos ouvir pelo menos uma pequena canção todos os dias, ler um bom poema, ver uma pintura de qualidade e, se possível, dizer algumas palavras sensatas. ” (Johann Wolfgang von Goethe)
Uma nuvem de poeira Se levanta na velha estrada, Recém recoberta com saibro, De um lado, as águas mansas Do rio Piraí serpenteando, Sob a sombra dos bambuzais.
As margens com seus aguapés, E do outro lado, as colinas, Com seus verdes tapetes Despenteados sob o vento Mesclados pela luz solar No crepúsculo escondido.
O apito da fábrica de papel Pontualmente toca Marca o compasso da cidade Avisa que é chegada a hora De mais um dia de batalha, Oh, tanta gente apressada...
Desloca-se a buscar condução, Vem do Chalet, Boca do Mato, Ponte Alta, Ponte Vermelha, Maracanã, de Barra do Piraí, A maioria anda de bicicleta Em suas vias tortuosas. A minha vila, Santanésia, Respira ao cair a noite, O doce aroma da primavera, O perfume das flores inebria Está por toda a parte, nos jardins, Nas frondosas árvores da praça...
E, qual vagalumes na noite, As pessoas vão caminhando Pelas calçadas bem limpas, De suas ruas estreitas Em uma visão pueril. O percurso nem é tão longo...
Mas há paradas obrigatórias, Na banca de jornais do Adamastor Para prosear as últimas notícias, Folhear revistas em quadrinhos, Ou esperar a bisnaga quentinha Na padaria do Paulinho... - Tudo anotado na caderneta.
Na COBAL, a manta de toucinho, Para preparar uns torresmos E depois preparar a mistura Com a gordura de coco carioca, Aquela com bonitas estampas, Assim como o sabonete Eucalol.
No açougue impressiona Aquela machadinha, Para cortar as costelas, Depois passar na barbearia Do Wallace: ponto de encontro Para discutir o futebol.
A turma das bebidas finas Ia ao bar do Antônio Lourenço E a da cachaça se encontrava No boteco do Senhor Lacerda Onde quebrei vidraça com pedra Ao ouvir “filho do Zé Leão” – Apelido que meu pai detestava.
A vida nos é dada a aventuras, E nesse andar de formiguinhas, Acabamos por tomar o rumo De outras estradas, novos lugares, Vamos traçando a nossa própria rota, Construindo o caminho...
Como José - o pai jardineiro -, Que chegou de Pau-de-Arara, Do Nordeste, mais um retirante Sempre a cumprimentar os passantes No seu jeito simples de homem do campo - É dele umas das lembranças mais fortes de minha Vila.
AjAraujo, o poeta humanista, recordando sua cidade natal, e a falta que sente de seu pai, brutalmente assassinado há menos de 1 ano, quando trabalhava como guarda em uma escola, escrito em 1987.
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