ouve lá ó alucinado - dedicado a trabisdementia

Data 27/02/2008 22:17:18 | Tópico: Poemas -> Dedicatória

Que dizer! Nada!
não sei nada!
sou um nada que em nada existe
sou um supérfluo perante o geral
sou um esquema mal montado
sou a parte mais sangrenta da vítima
sou o ignorante que diz que não
sou não sou ou não
Sou o partido mais contestado
Sou o zero encravado
Sou e serei o que talvez não seja
Sou a pata do bezerro
A corda a amarra o porco
O amarelo nos dedos do fumador
A unha encravada da velha
A chave que entra e não roda
Ai ai ai socorro!
Preciso de ler santo agostinho
Também eu tenho um sermão para dar
O meu será aos homens
Preciso de saber como se faz
O carniceiro diz que sabe
Não cobra nada por me ensinar
Desde que esteja bem afiada
Mas eu não tenho faca
Não uso canivetes
Não sei lidar com matracas
Tenho palavras que esperam a sua vez
Tal freguês a sufocar
Ai que desleixo meu
Ter aprendido a usar as mãos
Só para partir o pão
Só para passar as páginas
Só para não deixar passar a dor
Ó míticos enxovalhados!
Ó romeiros sem chavo!
Os autocarros vão cheios
Vão cheios e já voam
Vede a rosa encravada no jardim
Esmolai o cego e o bandido
Acrescentai gritos ao hino
Eu não sei se existo
Talvez minta
Se existo é noutros absurdos
Noutras alamedas de espanto
A ser desobediente
A ter um lápis a disparar
Versos de má fama
Poemas em cama desfeita
Mas não fui eu foi ela
eu alucinado
tu alucinado
nós alucinados
e eles, a destilar o aço para as suas bebedeiras.

Ouve lá ó alucinado, quem é que te mandou fazer versos assim?
vou dizer à tua mãe que tem um filho que é poeta
e nos intervalos gosta de falar de almôndegas e de
carros de rolamentos!



Este texto vem de Luso-Poemas
https://www.luso-poemas.net

Pode visualizá-lo seguindo este link:
https://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=30827