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 No caminho com Maiakóvski, que não é de MaiakóvskiData 01/05/2016 19:51:21 | Tópico: Poemas
 
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 NO CAMINHO COM MAIAKÓVSKI
 
 Eduardo Alves Costa
 
 
 Assim como a criança
 humildemente afaga
 a imagem do herói,
 assim me aproximo de ti, Maiakóvski.
 Não importa o que me possa acontecer
 por andar ombro a ombro
 com um poeta soviético.
 Lendo teus versos,
 aprendi a ter coragem.
 
 Tu sabes,
 conheces melhor do que eu
 a velha história.
 Na primeira noite eles se aproximam
 e roubam uma flor
 do nosso jardim.
 E não dizemos nada.
 Na Segunda noite, já não se escondem:
 pisam as flores,
 matam nosso cão,
 e não dizemos nada.
 Até que um dia,
 o mais frágil deles
 entra sozinho em nossa casa,
 rouba-nos a luz, e,
 conhecendo nosso medo,
 arranca-nos a voz da garganta.
 E já não podemos dizer nada.
 
 Nos dias que correm
 a ninguém é dado
 repousar a cabeça
 alheia ao terror.
 Os humildes baixam a cerviz;
 e nós, que não temos pacto algum
 com os senhores do mundo,
 por temor nos calamos.
 No silêncio de meu quarto
 a ousadia me afogueia as faces
 e eu fantasio um levante;
 mas amanhã,
 diante do juiz,
 talvez meus lábios
 calem a verdade
 como um foco de germes
 capaz de me destruir.
 
 Olho ao redor
 e o que vejo
 e acabo por repetir
 são mentiras.
 Mal sabe a criança dizer mãe
 e a propaganda lhe destrói a consciência.
 A mim, quase me arrastam
 pela gola do paletó
 à porta do templo
 e me pedem que aguarde
 até que a Democracia
 se digne a aparecer no balcão.
 Mas eu sei,
 porque não estou amedrontado
 a ponto de cegar, que ela tem uma espada
 a lhe espetar as costelas
 e o riso que nos mostra
 é uma tênue cortina
 lançada sobre os arsenais.
 
 Vamos ao campo
 e não os vemos ao nosso lado,
 no plantio.
 Mas ao tempo da colheita
 lá estão
 e acabam por nos roubar
 até o último grão de trigo.
 Dizem-nos que de nós emana o poder
 mas sempre o temos contra nós.
 Dizem-nos que é preciso
 defender nossos lares
 mas se nos rebelamos contra a opressão
 é sobre nós que marcham os soldados.
 
 E por temor eu me calo,
 por temor aceito a condição
 de falso democrata
 e rotulo meus gestos
 com a palavra liberdade,
 procurando, num sorriso,
 esconder minha dor
 diante de meus superiores.
 Mas dentro de mim,
 com a potência de um milhão de vozes,
 o coração grita - MENTIRA!
 
 
 Fonte: <http://www.jornaldepoesia.jor.br/autoria1.html>  Acessado em 01/05/2016 - 16:50 hs.
 
 
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