
ODE NOCTURNA
Data 22/09/2016 02:07:33 | Tópico: Poemas
| ODE NOCTURNA
I Os cães ladram na rua Sem qu’eu saiba por quê. Não há no céu estrelas; não há lua... Tampouco mais viv’alma aqui se vê. Observo da janela: Tudo escuro!... Por volta da meia-noite Ainda que me afoite [ eu a procuro... II Procuro em meio aos vultos, Que passam tão sombrios E envoltos de mistérios ‘inda ocultos, -- Entre alucinações e desvarios... -- Àquela cujos olhos rebrilhantes Me vem iluminar. Sem qu’eu possa a tocar [ qual tocava antes.
III Sim, ela foi-se embora. E eu... Fico aqui sozinho, Enquanto está n’algum lugar lá fora, Seguindo o seu errático caminho Pelas sombras de cada madrugada... Feliz -- ou ainda não... -- Já fez da escuridão [ sua morada.
IV Porém, sua presença De mim sinto tão perto, Que as alvas névoas d’essa noite imensa Parecem me envolver o olhar incerto Como fossem o alvor de sua pele... Imploro uma vez mais Que ouvindo ela os meus ais [ se me revele:
V -- “Vem, minha desejada, Pôr teus olhos nos meus... Detém um pouco mais tua jornada, Apenas para qu’eu te diga adeus! Não sei mais que fazer d’essa saudade, A não ser me entregar Depois de te encontrar [ na irrealidade...”
VI "Tu vens?! Já sinto a boca Beijar teus lábios frios... A minha pele à tua ávida toca E te arrepia os pelos tão macios... Murmuras o meu nome e te desnudas E atado por teus liames, Permito que tu me ames [ e que me iludas..."
VII "Gemidos já de fêmea Suspiras tão atraente, Que até a própria Vênus se vê gêmea De ti, porquanto amante bela e ardente! Tu soltas as palavras já sem nexo Nas línguas vãs do amor, Enquanto o meu ardor [ te orvalha o sexo."
VIII "Teu corpo sobre o meu Me cobre como um manto... À flor da pele um poema se escreveu N'uma ternura quase de acalanto. Tinhas amor na ponta dos teus dedos. Pois tu me conhecias Das noites mais vazias [ meus segredos..."
IX "Então as tuas unhas Cravaste em minhas costas -- À maneira dos versos que compunhas Que embora tristes tu, obscura, gostas -- Até sangrar-me a carne de prazer, Colhendo após meu gozo Co'o olhar mais amoroso [ que há-de haver."
X Senti gosto de sangue, Como o hálito da morte... Sobre mim, o seu corpo ainda langue Buscava uma carícia algo mais forte... Foi quando a possuí completamente: Tocando com mais calma Até que, ao fundo d'alma, [ a mente ausente...
XI Assim, depois de tudo Olhava para mim Como tivesse o olhar perdido e mudo Pressentindo estar perto já o fim; Como quisesse um pouco mais feliz Já tão triste final Embora fosse irreal [ o que me diz:
XII -- "O amor é uma morte Pequena tida em vida... E por mais e melhor que nos conforte Parece nos matar na despedida. Porque quem ama já não quer morrer... Agarra-se mais forte À vida do que a morte, [ sem saber..."
XIII Partiu como chegara Em meio à noite escura, Deixando uma alegria muito rara Feita tão lindamente de ternura! Não sei se era fantasma ou fantasia, Só sei que foi amada, Quer real ou imaginada [ a hora vazia.
Betim – 21 09 2016
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