Desabafo de um Doente Mental

Data 07/01/2017 19:05:42 | Tópico: Poemas -> Reflexão

(Poderá ouvir o poema recitado pelo próprio autor, tendo como música de fundo a bela canção “Vagabundo” interpretada pelo Trio Irakitana.)

Desabafo de um Doente Mental

Não me perguntem quem eu sou!
Vocês dizem que eu sou doente mental,
E é tudo o que vocês devem saber de mim afinal!
A minha ligação com o vosso mundo já cessou;
No meu mundo eu sei quem sou,
Tenho marcas, tenho referências;
No vosso mundo não aceito interferências,
Sou como as trevas sem princípio e sem fim…
E vocês não conseguem olhar para dentro de mim!


Não me perguntem o que quero!
Eu sou como o vento, não quero nada,
Apenas vivo para esvoaçar,
Até me cansar….
E por vezes sou inerte como água estagnada…
O vosso mundo já morreu em mim
Como morrem todas as flores
De um infértil jardim;


Não me perguntem para onde vou!
No vosso mundo não tenho rumo, não tenho metas,
Caminho em rotas fixas como os astros,
Ou vagueio como incertos barcos sem mastros…
E por vezes sou como um furacão...
Agito-me, chego e saio sem dar qualquer explicação;
No vosso mundo não tenho alvos, não tenho destinos,
Só uma revolta enorme dentro de mim,
E uma descrença sem princípio e sem fim;
Ah, como ao pé de mim vocês são pequeninos!

Não, não me perguntem do que gosto!
No vosso mundo não gosto de nada,
Não tenho preferências, odeio aderências,
E sou como o camaleão,
Tanto ando com pele de cordeiro como de leão;
Vocês chamam-me maluco com vozes de desdém;
Mas ao ver-vos daqui do meu mundo
Sinto com repugnância e com um horror profundo,
Que vocês são malucos também…


Sim, vocês são malucos, insanos, perversos, irracionais!
Basta olhar para o que acontece no vosso mundo;
Vocês sentem uns pelos outros um ódio profundo,
E aniquilam-se, matam-se uns aos outros como canibais;

Ah, e dizem que eu é que sou maluco…

No meu mundo eu sou normal,
E vocês no vosso são todos malucos afinal…

Onde vocês vêem espinhos eu vejo rosas,
Onde eu vejo caminhos limpos,
Vocês vêem escarpas pedregosas.
O que no vosso mundo é um inestimável tesouro,
No meu é apenas um falso brilho de ouro;
E o que para vocês é a razão das vossas vidas,
Para mim não passam de mentiras descabidas;
Não, não me perguntem nada!
Deixem-me viver a minha vida,
Mesmo que a vossos olhos seja mal vivida!
No vosso mundo sou apenas um doente mental,
E é tudo o que vocês devem saber de mim, afinal!



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