Dias alheios

Data 15/03/2008 14:39:34 | Tópico: Textos

Todos os meus dias são infalivelmente vestidos
da mesma lentidão sem peso,
como a imagem de uma estrada de terra
que persiste devotamente no existir precário,
incrustada num abandono plenamente obtido,
onde ninguém nunca vai.
São dias de uma força quente e grande,
e invariáveis, de paciência e resignação
com a miséria quase voluntária,
que é mais senhora de tudo que a água,
mãe do mundo.
Dias sem sangue, extirpados do sentido
que lhes devia amarrar ao nome,
dias alheios.
Porque uma vez eu quis dissipar
as neblinas dos meus olhos,
despertar a voz ferruginosa do meu peito,
beber os orvalhos que brotam no seio do inusitado, a alegria cogitar
- foi um crime de guerra sem propósito - prenderam-me.
Acorrentada, eu pago com meus dias os dias que ousei sonhar.









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