XI - O genioso fidalgo Dom Quixote da Mancha
Data 06/08/2018 16:32:32 | Tópico: Épicos
| XI - Décimo primeiro episódio que trata do que sucedeu ao cavaleiro com uns cabreiros e de como concluíram que era um maluco (completo)
O "famoso" Dom Quixote conforme muitos autores estava sempre disposto malgrado vários fatores a cruzar toda Espanha defendendo seus valores
Todavia os relatos de suas doidas ações apresentam divergências em variadas questões inclusive no seu modo de fazer as refeições
Manuscritos apresentam o fidalgo ingenuoso esperando por convite em banquete suntuoso por julgar ser a rotina de um paladino honroso
Em outros o cavaleiro tem por grande honraria ser privado e provado em coisas do dia-a-dia aceitando alimentar-se com qualquer comedoria
É bastante ilustrativo o encontro com cabreiros que tinham como costume receber os forasteiros que passavam na estrada com modos hospitaleiros
O registro do encontro com riqueza detalhado encontrei em um caderno que apesar de amarelado tinha um texto legível totalmente conservado:
E sabendo os cabreiros que estavam de passagem eles foram convidados a fazer uma paragem para ali no acampamento descansarem da viagem
Enquanto o escudeiro amarrava os animais Quixote era tratado de maneiras cordiais sendo oferecido a ele cozidos e coisas tais
Fizeram ele sentar-se em gamela rente ao chão para que Sancho servisse a bebida a seu patrão e esperassem uma cabra cozinhada em caldeirão
E Quixote ao escudeiro disse nesta ocasião: - Quem serve à cavalaria seja em qualquer função senta no mesmo lugar onde está o seu patrão
Mesmo vendo no convite uma grande honraria Sancho Pança intimidado dispensou a cortesia que regras de etiqueta o mesmo desconhecia
Mas Quixote insistiu no convite formulado obrigando o escudeiro a sentar-se do seu lado e assim aquele assunto ele deu por encerrado
E com aqueles cabreiros no entorno da fogueira o escudeiro sentiu a chegada sorrateira de uma quase saudade de sua lida campeira
Comendo com regozijo a carne que foi servida e secando uma guampa onde estava a bebida Sancho para os cabreiros disse sobre a comida:
- Um sujeito como eu que é torado no grosso uma cabritinha dessas vai roendo até o osso que com fome apertando não existe o insosso
- E como diz o ditado toda coisa que se come não sendo uma iguaria se tempera com a fome e cemitério de cabras é o nosso abdome
Pois D. Quixote no meio daquela gente simplória pediu atenção a todos pra contar uma história das muitas que ele tinha conservadas na memória:
- No mundo corria a fama dos doze pares de França mas o Conde Galalão com o plano de vingança ajustou com sarracenos a mais torpe aliança
- E ali nos Pirineus a garganta escarpada foi o cenário perfeito para uma emboscada que por sua felonia tinha sido planejada
Sancho Pança escutava com bastante atenção o relato entusiasta que fazia seu patrão da batalha derradeira do cavaleiro Roldão
- Subiram os doze pares ao lugar mais elevado da penedia e viram todo o vale ocupado pelas tropas sarracenas que ali tinham chegado
- Uma grande epopéia desvendava seu enredo Vislumbrando a figura dos pares sobre o rochedo os sarracenos sentiram um arrepio de medo...
- E Roldão estava pronto pra lutar mais uma vez com os maiores rivais do exército francês Seu amigo Oliveiros apelou pra sensatez:
- Não podemos enfrentar a falange estrangeira que agora está cercando esta região inteira Eles tem cinquenta mil somente numa fileira
- E Roldão deu a resposta instigado em seu brio: - Os doze pares armados lutando horas a fio seriam suficientes pra render duzentos mil
- Se a falange inimiga é aqui mais numerosa nossa vitória será ainda mais grandiosa pra honrarmos a milícia da nação mais valorosa
- Sem ainda concordar com seu amigo Roldão Oliveiros alertou que o biltre Galalão tinha tudo planejado pra fazer a traição:
- Que evite a cilada peço a nosso comandante Carlos Magno ao menos não está muito distante Você pode avisá-lo tocando seu olifante
- Mas Roldão a Oliveiros nesse ponto foi conciso: - Chamar o imperador eu sei que não é preciso e não tocarei a trompa para dar qualquer aviso
- Nós somos numa peleja osso duro de roer e soldados mais altivos inda estão para nascer Hoje vamos ver o mouro debandar ou se render
- Oliveiros repetiu seu pedido ao comandante refletindo ser melhor que tocasse o olifante uma vez que o soberano não estava tão distante:
- Peço a nosso capitão que escute o que digo Como é mais numerosa a falange do inimigo não precisamos expor nossos homens ao perigo
- E o conde desprezando o exército mourisco respondeu que na peleja não corriam nenhum risco: - Hoje vão se enfrentar o trovão e o corisco
- Se estão em maioria não precisamos saber No final desta peleja muito tempo vamos ter pra contar e recontar quantos vieram morrer
- Mesmo tendo que travar uma luta encarniçada minha guarnição fará com a lança e a espada cada mouro se render ou bater em retirada
- No lugar do olifante para dar algum alerta tenho minha Durindana e pagão que ela acerta ou suplica a rendição ou se aparta e deserta
- Terminada a discussão decidiram por lutar O exército dos francos depois de se equipar foi descendo pelo vale para os mouros atacar
- Percebendo o avanço dos franceses no terreno rei Marcílio na batalha comandante sarraceno ordenou o contra-ataque com apenas um aceno
- E Roldão saiu na frente seguido pelos demais Golpeava com a lança assombrando seus rivais Nenhum mouro escapava das estocadas fatais
- Chefiando a vanguarda o paladino de França desde o primeiro golpe mostrou a sua pujança Derrubou vários pagãos até quebrar sua lança
- Só então ele sacou sua arma Durindana e montado em Bridadoiro avançou pela savana visando desbaratar a milícia mauritana
- Sarracenos acossaram o bravo duque Buzim que brandindo sua arma disse a eles assim: - Mais de um é pelotão e a todos vou dar fim!
- E partiu dando espadada tão a torto e a direito que seu golpe fulminante na cabeça ou no peito o oponente mais forte derrubava desse jeito
- Outro grupo novamente avançou contra Ricarte que no grosso da ação inda não tomava parte pois estava ocupado carregando o estandarte
- Sir Ricarte retirando sua arma da bainha desferiu um duro golpe no que mais afoito vinha que levando a cutilada nunca mais comeu farinha
- Como os outros pagãos prosseguiam atacando manejando a espada um por um foi derribando pra deixar lá na Arábia mais viúvas pranteando
- No avanço dos franceses que lutavam muito bem um guerreiro só caía derrotando mais de cem O comandante Roldão não perdia pra ninguém
- Confirmando o paladino sua fama de valente com a sua Durindana derrubava prontamente todo e qualquer soldado que cruzava sua frente
- Como ele precisava atacar o rei pagão para abreviar a luta e forçar a rendição quando ele o avistou foi na sua direção
- Percebendo a manobra vários mouros em ação as frentes abandonavam para atacar Roldão No entorno do guerreiro era grande a multidão
- Com destreza absoluta a espada manejando prosseguia o paladino no terreno avançando Sem errar golpe nenhum ia a todos derribando
- De repente apareceu um enorme elefante deixando cada francês assombrado e ofegante com a sua aparência monstruosa e gigante
- Montado no paquiderme vinha o melhor arqueiro procurando alvejar com o seu arco ligeiro o mais bravo paladino só com um tiro certeiro
- Pois no alto da colina ficou ele esperando a passagem de Roldão que já vinha avançando sem o mesmo perceber o arqueiro tocaiando
- Choviam setas francesas no arqueiro vigilante mas nenhuma o acertava por estar muito distante Foi então que Oliveiros disparou no elefante
- O elefante africano alvejado pelo flanco esmagou vários pagãos rolando pelo barranco Quem ali não sucumbiu saiu da batalha manco
- Eram muitos sarracenos que rechaçavam Roldão na defesa de Marcílio o versuto rei pagão promovente da falsídia com o conde Galalão
- E no confronto direto com o biltre rei pagão o melhor que conseguiu foi cortar a sua mão que levando esse golpe retirou-se da ação
- Com intento de barrar a investida dos francos os soldados sarracenos nos penedos e barrancos faziam pedras enormes rolarem aos solavancos
- Os franceses atraídos para os desfiladeiros sem ter o conhecimento dos terrenos traiçoeiros sofriam grande revés pela perda de guerreiros
- Nessa hora a batalha foi ficando mais intensa Cada baixa dos franceses era uma perda imensa que um soldado a menos já fazia diferença
- E como se fosse pouco ser menor seu efetivo foi subindo pela serra no momento decisivo outra leva de soldados com impulso combativo
- Chegavam muitos cavalos trazendo mouros no dorso Os sarracenos tirando vantagem deste reforço forçavam cada oponente a lutar com mais esforço
- Quando vislumbrou ali seu exército minguando acredito que Roldão percebeu estar jogando seu xadrez num tabuleiro cheio de peças faltando
- Só então que abalado disse para Oliveiros: - Não podemos mais contar com a fibra dos guerreiros que a tropa vê chegar seus momentos derradeiros
- Por ter sido vaidoso com a força do meu braço e dos outros paladinos cometi um erro crasso vendo o nosso efetivo pelejando mais escasso
- Reconheço que eu sou o responsável por isso Não podemos resistir a outro ataque maciço Nossa tropa de elite faz seu último serviço
- A imensidão do vale as montanhas colossais a profundeza dos rios longos e torrenciais dessa hora tenebrosa deram todos os sinais
- Assim eram os guerreiros que aqui eu represento Por honrarem a bandeira, seu cavalo e armamento tem que ser mencionados sempre com devido acento
- Um perfeito cavaleiro tem nobreza e coragem um desejo permanente de honrar sua linhagem ser pujante em batalha e fiel na vassalagem
- Vocês tem o privilégio de conhecer o famoso Dom Quixote, cavaleiro tão honrado e corajoso que na Espanha não há um outro mais valoroso
- Sou espelho e resplendor dos cavaleiros andantes Maior que Rodrigo Díaz Amadises e Tirantes Melhor do que Palmeirins e guerreiros semelhantes
- Agradeço o tratamento com respeito e cortesia que a nós foi dedicado uma vez que é primazia dos cavaleiros andantes toda sorte de honraria
E cada um dos cabreiros aceitou ficar quieto escutando Dom Quixote com seu discurso repleto de disparates próprios de um maluco completo
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