Palco Infinito

Data 05/04/2008 08:23:52 | Tópico: Poemas -> Surrealistas

Há um cansaço no bater d’asas daquela gaivota
Um arfar de peito
Inquieto

Há um luar plasmado na falha tectónica daquela fraga
Uma estrela de mar
Estremecida
Arrancada
Jazida morta e ainda semi-viva
a bailar em palco, proscénio atípico do Ser, actor.
Em cena um nada.
Um talvez.
Um de vez em quando.

Há um malmequer em flor em cara de lua cheia.
Nomeio-lhe a boca:
Atávica, apática, apátrida:
Sem choro
Sem riso
Sem pranto.
E o olhar, um mar rebelde, um mar sempre a crescer
de outro antigo, manso, arável.
Busco-lhe a derme:
Um crivo de crivar a vagem, o ferro,
no peso ubíquo da mó
imparável,
bago a bago,
e o trigo expelido por sobre, em pó:
Fino, branco, branco…

Há um cansaço e tanto,
um estado d’alma permanentemente exangue
perscrito no esvoaçar d’insectos letrados.

Um ribeiro de sangue escorrido em pontas aladas dos meus dedos
(que os cortei lavando copos, cálices utópicos, cristais tão finos,
na agonia de os ver luzir brilhantes).

Existe no rosto das águas a espuma, a palidez da dor estampada
(que tanto a sinto).
Varejo e bebo do verbo o último sopro.
Amotinado. Insurrecto.

Olho a falésia e vejo-a à minha espera
abismada em grinaldas, em pérolas d’hipérboles.
Deliro em febres altas
em vagas para lá de alterosas e oiço-as, as vozes:
Apavoradas no buliçoso acústico de fonemas.

Então sustenho o ar,
em apneia fundeio-me na tua alma em forma finita
na infinitude de ser parábola a tender para o Infinito.
E sou-te nada
E sou-te tudo
sendo tão só, palavra, lua verde olvidada, musa inventada de noites de luar.



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