À Espera de Um Milagre
Data 08/11/2019 23:44:41 | Tópico: Textos
| À Espera de Um Milagre Uma breve reflexão sobre o acolhimento de crianças, em medida protetiva, acolhidas por Famílias Acolhedoras. Um prisioneiro aguarda a sentença de morte nos porões de uma prisão norte americana. Um carcereiro se convence de que ele é inocente, mas não consegue impedir a sua execução. Esse é o enredo de um drama hollywoodiano, À Espera de Um Milagre , sucesso dos anos 90, vivido pelo carcereiro (Tom Hanks) e o preso (Michael Clarke Duncan), um negro com restrições mentais e dons sensitivos, condenado à execução em cadeira elétrica, pelo assassinato de duas crianças, gêmeas de 09 anos. A mãe de duas crianças (Ana de 09 anos e Alice de 07 anos – nomes fictícios para preservar as crianças) perdeu a guarda das filhas por abandono e falta de cuidados essenciais. Após 01 ano e 07 meses, as crianças estão voltando para casa. O drama vivido pela mãe e pelas crianças, é o retrato de milhares de famílias brasileiras que passam pelo processo de perda da guarda de seus filhos, por motivos diversos. As crianças, em medida protetiva, foram acolhidas em uma FAMILIA ACOLHEDORA, projeto que está em algumas cidades brasileiras, e é uma medida de garantia dos direitos das crianças e adolescentes. As crianças protegidas são acolhidas em lares, onde passam a conviver com toda a rotina familiar, em uma tentativa de amenizar a dor que sentem pelo rompimento da relação com a família de origem e a angustiante espera pelo retorno ao lar ou o encaminhamento para a fila de adoção. As crianças acolhidas pelas famílias chegam totalmente desestabilizadas, assustadas, acuadas, fragilizadas, inocentes e condenadas... Condenadas a viverem em uma realidade desconhecida, amparadas pelo carinho de um lar e pelo ECA (Estatuto das Crianças e Adolescentes). Os direitos das crianças e adolescentes são extensos. No Brasil temos uma estrutura invejável para a proteção das crianças e adolescentes, digna de países desenvolvidos, com uma lista bem elaborada de ações, fóruns, instituições e órgãos de direitos, que garantem proteção digna aos vulneráveis e condições de seguirem em frente, como cidadãos do bem, amparados pela sociedade, que lhes garante proteção legal e inserção social. A mãe, Aurora (nome fictício), tem ainda outros 04 filhos e 01 neta. Aurora era usuária de álcool e se submeteu a um tratamento em clínica especializada por 09 meses. Concluiu o tratamento, retomou o trabalho e está reconstruindo a vida. Recebe as crianças com entusiasmo, ansiedade, angústia pela longa espera, alegria de retomar as filhas, esperança de uma vida diferente e também condenada... Condenada a viver com um salário que não lhe dará condições de criar com dignidade todos os seus filhos. Condenada pelo preconceito de ser mulher, negra, pobre, favelada e varredora de rua. Certamente está no “caminho certo”. Carrega a dor de ter sido maltratada a vida inteira, de ter reproduzido a mesma experiência com os filhos. Carrega a missão de fazer diferente. Construir uma história diferente para Ana e Alice. Aurora terá que se reinventar, com a ajuda de vizinhos, familiares, colegas de trabalho. Não duvido que consiga, porque já passou por tantas desgraças que se apega a sua força e a de suas filhas para reconstruir. Ana e Alice também querem recomeçar. Sabem dos seus direitos, aprenderam a ser amadas, aceitaram o cuidado da Família Acolhedora e a proteção do Estado. Também não duvido que podem conseguir, porque são vencedoras e sobreviventes. Já sofreram e foram acolhidas, desamparadas e foram amadas. Podem se reerguer. Contam com a Aurora e com a vontade de crescer com dignidade e com garantia de direitos. No filme, o carcereiro não passou impune por não ter conseguido livrar um inocente da morte. O preso tinha dons especiais e deu “um presente” ao carcereiro, que sempre lhe tratou com dignidade e cuidado. Ele ganhou muitos anos em sua vida. Envelhecia lentamente e presenciava todos que amava morrerem, sem saber quando seria a sua vez. Nós, famílias acolhedoras, presenciamos a transformação dessas crianças e da família de origem, que chegam aos pedaços e retornam com esperança e possibilidades. Ansiamos, lutamos e esperamos por muitas mudanças, que passam pelas políticas públicas, pela distribuição de renda, pela geração de empregos, pela melhora na educação, pela reforma política, pela mudança de atitude, pela mudança de um BRASIL. Ana e Alice se vão. Nós ficamos aqui, à espera de um milagre... Autor: Frank Alysson de Oliveira Pinto Esposo da Mônica, pai do Daniel e da Júlia Membro de uma Família Acolhedora de Belo Horizonte.
|
|