
Faltam quatro
Data 14/08/2020 01:46:58 | Tópico: Poemas
| Quatro anos passam rápido. Tenho um companheiro zombador, o espelho alongado do banheiro, que além de roto pelas beiras, anda meio debochado. Por mais que eu vague pela casa retorno para ele e me observo. Sorrio desbotado para ressaltar as rugas, que sem muito esforço já aparecem. Uma em especial, aliás duas, surgiram há alguns anos e vieram para ficar. Os cabelos brancos se firmaram e já não aceitam o Grecin cremoso. Dias desses a Joh até inventou que me queria ver barbudo, mas os pelos brancos mancharam a pele do meu rosto malencarado. Ainda bem que ela se divertiu com a minha agonia. Retorno para o espelho, no banheiro, com a desculpa da incontinência urinária, mas, na verdade, é para mais uma vez me observar e constatar que faltam quatro... Espio as orelhas para ver se de fato sempre crescem. Ainda não percebi essa desproporção. Tomara que comigo falhe, pois acho horrível orelhas grandes. Tenho bela voz, é o que dizem, experimento falar, resmungar qualquer coisa e percebo que devia ter a voz um pouco mais grave, mais madura, talvez, pois faltam quatro. Preciso orquestrar os meus gestos para ensaiar a terceira, que logo virá. Apresso-me em sair da frente do espelho debochado e sinto-me normal, jovem, aliais, dizem que somos sempre jovens se nunca nos olharmos no espelho. Faltam quatro, mas caminharei com passos firmes para a terceira. Que venham as rugas, as feiras e as enfermeiras, as enfrentarei!
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