poema de Rehgge Camargo declamação de José Silveira
APITO DO TREM
Carpi com enxada cega meu roçado e plantação Copiei o joão-de-barro, fiz meu ranchinho no chão Minha ciência era abrir picada com meu foião Remirava a estação, colhia café das seis às seis Comemorava Festa de São João e Folia de Reis.
"Sempre quis saber de lá daqui dalém Meu sonho chegava, viajava no apito do trem."
Um picadão, mão calejada, nome no dedão Pescava nos lagos límpidos de minha terra De serras e um regato que ia pro grotão... Meu Deus, o rádio, a impaciente mocidade Me seduziu, fechou deste casca grossa a visão Que se abriu curiosa à ciência da cidade.
"Sempre quis saber de lá daqui dalém Meu sonho chegava, viajava no apito do trem."
Peguei o trem, cá estou saudoso dalém daqui Encorujado, triste, feito sabiá no alto do jequitibá, Valia mais meu cercado de balaústre, meu ranchinho De tranca na porta, tramela na janela, que a prisão Deste casarão de pedras e cimento cobrindo o chão.
"Agora quero saber de lá daqui dalém Meu sonho volta, viaja no apito do trem."
O dinheiro é o sangue, a terra o coração A ciência não traz pra este mar de construção O cheiro, e o verdor natural do meu sertão, Aqui tudo é diferente, a gente sofre, a gente sente Que no céu se apagaram tantas estrelas Que só brilham sobre o trem de Presidente.
"Agora quero saber de lá daqui dalém Meu sonho volta, viaja no apito do trem."