Fevereiro

Data 16/06/2025 16:00:16 | Tópico: Poemas

Então, os olhos que fizeram morada de tantas lágrimas
Calaram-se qual a tempestade que se despiu dos ventos
Como o pássaro que, engaiolado, abdicou de seu canto
O tempo consumado se saciou na quietude dos minutos
E assim estes olhos passaram muito tempo adormecidos
Numa tarde de outono, era quase noitinha e ela chegou
No meu peito ferido, cicatrizes vibram com sua chegada
Vestia branco, como a verdade que brilha nas clareiras
Abriu a porta para o pássaro voar e ele não foi embora
Antes, lhe pousou no ombro e afinal ali pôde descansar
Um silêncio de céu, mar e luz, um silêncio transluzente
Sob essa luz o pássaro segredou cantos no ouvido dela
E com a ponta dos dedos, esquadrinhou a sua geografia
Sobre suas asas de almíscar, brilhou uma luz lápis-lazúli
As criaturas da terra veem os ponteiros mirarem o céu
Meio-dia é consumado, chegou a hora de colher frutos
O sol cintila sobre o chão crestado, ainda é tão deserto
E a luz dispersa as sombras reunidas à noite, sob a cama
De um sono fustigado e sem sonhos, é preciso acordar
Dar-se conta de que habitava um continente de cegos
E a mentira nutria os espelhos desse mundo sem portas
Empertigo-me na cadeira, a pulsação tranquila e ritmada
Confesso que sei, a morte pode vir no azul do horizonte
Viro a página, risco um poema, afinal, já não é fevereiro




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