Herança

Data 16/07/2025 18:09:33 | Tópico: Poemas

O tempo depois de todo o tempo, por incontáveis eras
Dos séculos, das migrações, do vozerio à beira da água
Ainda me quedo à tua espera, coberto do pó da estrada
Tal marca indelével, uma cicatriz de vidas e de mortes
Velha procissão das gentes em seus vestidos coloridos
Eis-me aqui, depois de tudo, transmutado em essência

O sol nasce e se põe sem descanso, de tempos remotos
Crestando o calcário, fendendo suas alvas porosidades
Sigo por teus labirintos exercitando a minha pequenez
Na brevidade de mais uma vida, ansiando deixar marcas
Nas paredes, nos pátios, nos mais secretos cantos, a ti
Para que me vejas, na minha transparência quase aérea

Chego a este lugar, onde te espero desde todo o tempo
Nos territórios de meu secreto reino, local de mistérios
Onde emanam intocados, todos nossos primevos sonhos
Mas que percorro solitário, aguardando a tua chegada
A fim de destecer as teias dos que nos querem afastar
E por isso te chamo, sob a luz do sol que devora os dias

Teu nome foi escrito no sangue a me percorrer as veias
No quadro alegre da memória, ainda brincamos de viver
Entre os muros que limitam mais uma curta existência
Na vocação da espera o que meu peito sente incansável
Os olhos negam sem indulgência à caprichosa esperança
Nesta vigília que sei não virás e a dor é a única herança


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