Exilio forçado

Data 28/07/2025 11:18:03 | Tópico: Textos

Fui expulso e escorraçado sumariamente de casa como um cão sarnento pela minha excelentíssima companheira só com minhas roupas e os documentos. Vinte anos de vida conjugal em comum foram jogados no ralo da minha existência. Nada me restava a não ser sair enquanto havia tempo, o clima esquentou depois que fora ao banheiro logo que acordamos e percebeu suas genitálias vermelhas e feridas – a mulher saiu bufando, soltando fumaça por todas as ventas:
- Seu cachorro ordinário, olha o que você fez comigo – disse-me em beira na beira da cama, eu ainda estava deitado e entrei em colapso – Bem que eu desconfiava de você e suas putas e aqui estar as provas.
- Eu, eu – tentei argumentar e me defender mas a baixinha não dava folga, vermelha como um tomate reluzindo ao sol.
- Vamos, pega as tuas coisas e sai daqui agora, seu ordinário – e foi me puxando, forçando-me a levantar – Vai...
Confesso que fiquei sem ação, ainda um pouco sonolento depois de uma boa noite de amor onde fizemos planos para tirarmos as férias junto e viajarmos até Salvador, Fortaleza e Barreirinha. Continuava não entendendo nada, ela tirou a toalha e mostrou-me as suas virilhas branquíssimas bem vermelhas e com umas bolinhas.
- Tá vendo, seu cachorro você me contaminou com alguma doença, seu filho da puta – Me Deus durante todos esses tempos juntos nunca a vi se expressar dessa maneira. De cima do guarda roupa tirou uma valise e a jogou sobre o colchão ainda desfeito com as marcas de nossas delicias sexuais. Aproximou-se de mim e deu-me um belo tabefe que ecoou pelo quarto todo reverberando pelos outros cômodos da nossa. Abriu as gavetas e foi jogando as minhas roupas – Pega, e vai te embora, seu safado de merda.
Coloquei-as na valise, assim como o sapato de trabalho e vesti uma bermuda e sai mais triste que goleiro depois de um frango. No terraço ainda olhei para trás e tudo estava como sempre imutável silencio. E assim começou o meu êxodo – ainda tentando entender o que aconteceu – Foi pura moleza, a primeira vez que pulei a cerca com uma colega da repartição e deu no que deu – eu também estava com a mesma zigzira – tudo vermelho e empolado. Não prestei atenção na evolução, não dei a minha tenção para aquela coceirinha. Santo Deus! Que puta sacana. E para onde ir? Pouco dinheiro, estava no meio do mês – e salario de funcionário publico não dura muito – A rua ainda estava deserta. A valise na mão e uma mochila nas costas levantaria suspeita dos meus vizinhos abelhudos que não me olhavam com bons olhos, achavam que eu e ela éramos soberbos devido aos nossos empregos públicos e não tínhamos muita intimidades com eles. Então seguir para a parada de ônibus ainda desnorteado.

Ainda imerso no turbilhão negro e inesperado, sentia-me sem chão. E quando rolei a catraca do ônibus na ultima parada do Maiobão, foi que caiu finalmente a ficha do nefasto acontecimento e sentando-me na ultima cadeira do lado da janela – uma nova realidade descortinava diante e dentro de mim – com a mochila em cima da valise – eles sobre o meu joelho encolhido- Fui expulso de casa e sem direito a nada. Meus olhos começaram a mourejar, vinte anos vaporizados sem aviso prévio, ainda bem que não tivemos filhos. O ônibus começou a movimentar-se e aos poucos as cadeiras foram ocupadas – e ao entrarmos na rodovia MA – estávamos lotados, pessoas em pé espremidas com sardinhas em lata olhando sem vida para a paisagem insossa de todos os dias. Eu desconfortável, nesse horário, Mariinha preparava o nosso café e o colocava na mesa e juntos sempre alegres trocávamos juras de amor. E de repente lá estava eu como um retirante com um futuro sentimental incerto.
Depois de quase uma hora sacolejando, cortando a cidade de ponta a ponta, desci no Terminal da Praia Grande, no centro antigo. Hora de movimento intenso de pessoas e ônibus. Fui a lanchonete e merendei mesmo sem fome, um nó desgraçado na garganta. Sentei e fiquei matutando para onde, e quem poderia me acolher até eu receber o salario e alugar um quarto. Também tinha que guardar as tralhas e me preparar para o expediente a tarde no juizado especial do João Paulo. Então resolvi segui para casa do meu irmão mais velho que morava no Anjo da Guarda.
Quando ele abriu a porta e viu minhas parca bagagem , arregalou os olhos de espanto e fez um bico:
- O que foi que aconteceu, Zé Maria? Tão cedo, vai viajar? – e fez o sinal para entrar na estreita sala onde um bebezinha de fralda e uma mamadeira assistia um desenho animado sentada num sofá que já viu tempos melhores. – Entra, mano – fez o sinal com a mão e ficou na porta do corredor – Zefinha, vem cá mulher, olha quem estar aqui mora dessa?
Não demorou minha cunhada, uma branca amarelada botou a cabeça, espionando-me:
- Virge Maria! Que milagre é esse seu Zé, o senhor aparecer mora dessa? – perguntou esfregando as mãos para tirar o excesso de espuma e ficando ao lado do marido e me encararam sem pestanejar as tralhas no chão perto sofá estoirado.
- Sai de casa, Mariinha me botou pra fora – disse de supetão bem baixinho.
- Que babado e o que senhor aprontou? Vocês que eram só amor – fez um beiço para o meu incrédula irmão que coçava a pança proeminente de cerveja. – Mariinha fez isso mesmo, não acredito. E ai?
- Eu queria passar uns dias aqui se puder? – Disse meio sem graça olhando para chão e com medo de encara-los.
- AQUI? – Disseram em uníssono que até a bebezinha parou de mamar e lançou um olhar inocente.
- É se der – respondi quase chorando.




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