delírio dos espelhos

Data 20/08/2025 13:13:51 | Tópico: Poemas



um cavalo de vidro atravessa a sala
e sua crina são relógios derretidos.
as pessoas aplaudem
com mãos de fumaça
enquanto mastigam janelas
fechadas.

um beijo escorre da parede
transforma-se em escada
e alguém sobe até o teto
do esquecimento

lá do alto
os abraços derramam-se verdes
sobre bocas sem céu

na calçada
um sapato fala com outro
discute sobre o peso da solidão
enquanto aponta as veias do coração
da cidade adormecida

sob sol
um barzinho despido da noite
estremece um copo
onde um casal dança no seco
no ritmo entubado de uma música

no corredor que foge de um lápis
as palavras pulam das línguas
viram pássaros sem penas
e afogam-se nas poças de chuva
enquanto um homem veste
uma nuvem
chora relâmpagos
e ri trovões
para a mulher que oferece
maçã recheada de maresia
para amarem-se dentro
do mesmo espelho rachado

tudo gira
gira a escada sem patamar
gira a lua no fundo de um prato
gira o silencio enrolado em serpentinas
gira a multidão com olhos quebrados
fazendo o chão florescer com pétalas negras
que todos aplaudem
como plateia de teatro
mas o palco é apenas o instante
cru em que vivência
relação e sonho
decidem usar a mesma máscara

parece silhueta de sono
mas se em algum momento
ocorrer o despertar
não se saberá se fomos atores
ou apenas sombra do público
invisível que nos observa dormir




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