
Pesam-me os olhos
Data 24/08/2025 14:06:39 | Tópico: Poemas
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As palavras não pedem licença. Caem. Como cinzas sobre a pele nua do tempo. Ficam. Gravadas a ferro quente na carne branca da página. Sem perdão. Sem regresso.
Disseram-me: “Não abras o livro que sangra.” Mas eu abri. Com dedos trémulos e olhos em febre. E lá estavas tu em cada linha que me queimava a memória.
O escritor avisou: “Não escrevas. A tua dor é demasiado bela.” O alfarrabista gritou: “Queima tudo, ou serás devorada pelas vozes!”
E eu obediente rasguei cada verso que me tocava. Mas a tinta ficou nas mãos. E as mãos ficaram em mim.
A folha vincada a quente. A folha vincada a quente. Repito
como quem reza como quem tenta apagar o nome do desejo.
Fui ter contigo como o sal vai à ferida. Como o silêncio invade o quarto depois do grito. Como o mar engole o rio e nunca o devolve.
Agora pesam-me os olhos.
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