O mundo do Sr. Con

Data 17/10/2025 18:02:33 | Tópico: Textos

Decimo primeiro dia -2021 – segunda-feira
Na Praça das Sete Palmeiras, um novo gato no pedaço, um rajadão bem nutrido e carente, deitou-se no mesmo banco que Con estava sentado lendo e sem o menor pudor ergueu-se e começou a esfregar-se nele, ronronando, obrigando-o a interromper a leitura de “Hospital”. Chateado com a intromissão, levantou-se e o sacana do bichano o seguiu enroscando-se entres suas pernas até o box de Chita. Parou e sentou-se sobre o traseiro e ficou contemplando-o a atravessar a rua 18.
Seu Raimundo da bicicleta sofreu um pequeno acidente, um carro deu uma bisca na garupa de sua Rocinante jogando-o no meio do asfalto em frente a portaria da Vale do Rio Doce. Quebrou o supercilio e o torceu o braço direito, inchando-o. Ia ao bairro do Anjo da Guarda comprar um camarão para beber o caldo com sua crush. O motorista foi bem atencioso e gentil, levando-o ao hospital e depois a sua residência. Ele tem mais de setenta anos, mais ainda é bastante agil e objetivo.
Começou o ferro do caboco de Viana e soldou uma trave, ganhando 20 reais.
E o resto aquela mesma de todas as manhãs – pensão, mercado, compadre, Glacial, Glacial – levando duas para degustar na pensão antes do almoço. Trocou Artur Hailey por Cynthia Freeman “Pode servir o Vinho”
Uma coisa o encabulava, como alguns de seus livros publicados pelo Clube de Autores foram parar no Google-books. Como? Ninguém lhe comunicou nada, ficou até surpreso e ao mesmo tempo alegre ao vê-los naquele site. Inflou o seu pseudo-ego de escritor, pois a editora alegava que seus livros não vendiam. Isso o deixou caidaço e com a sensação que era um perfeito idiota. Decidiu não publicar mais nada. Preferia postar seus textos nos site e nos grupos literários da web.
Mas continuou a escrever sem compromisso, apenas para satisfazer a sua alma de escriba... seguia o exemplo de Tolstoi, escrever sobre a sua aldeia... e assim fazia para o seu deleite pessoal.

Quinta-feira, 09 de fevereiro d 2023
Hoje a vista amanheceu bem ruim mesmo, quase impedindo-me de fazer o que mais gosto de fazer nessa vida: Ler & Escrever – principalmente agora que releio um clássico da nossa literatura do século passado, que li a quarenta anos atrás quando eu tinha um exemplar – “Quarto de despejo – Diario de uma favelada” da mestra Carolina Maria de Jesus publicado em 1960 a vida corrida é triste dessa senhora mãe de três filhos, morando num barraco na Favela do Canidé – SP. E para sobreviver cata papel, ferros e etc. Muito bom.
Friday, 10
A mestra Carolina de Jesus tem razão quem bebe não prospera – tiro por mim, gastando o pouco que ganho sem necessidade. E ontem a tarde não fugiu a regra, vim apanhar dez reais para beber apenas cinco doses de vodka – mas o capiroto meteu a mão e acordei com dois reais, uma ressaquinha abusada e uma caganeira dos diabos.
Saturday, 11
Dormi bêbado, encontrei com uns parceiro que pagaram umas rodadas de ‘brejas’ no finado Bispo e despertei ébrio, fraco tremulo e viajando na maionese de que Juvan tinha me dado dez reais – ledo engano, já pensava em matar a ressaca com uma geladinha dentro do mercado antes de abrir.
Depois que fechei a oficina cair no campo manguiando aqui e acola – encontrei um velho paraceiro que fazia mais de dez anos que não nos encontrávamos – não deu outra, ripa na chulipa.
A noite doisão fui visitar o meu filhote na volta reencontro outro parceiro e tome conhaque – e pum apaguei.
Domingo acordei naquela base e fui tomar café na casa de uma velha amiga, na volta vendi “Fabulas” de Esopo para o poeta Janaike que deu quatro reais – Na praça daas Sete Palmeiras, Calabresa, um velho parceiro de chila preparava seu carrinho de bebidas para encarar os festejos da noite e deixei logo um real e o diabo virou moleque e a noite que encarnei – ele me chama de poeteiro e tomo vodka e good bye – Na segunda nem me levantei estava botando os bofes para fora – fui almoçara era três horas da tarde, um pouco de feijão branco com um galeto assado e não tive apetite para jantar.
Terça-feira, 13
Para me reencontrar um pouco de leitura, até desenferrujei o meu francês relendo um trecho de “Les Miserables” – um clássico de todos clássicos do mestre Vitor Hugo, mas não relaxei a nossa Carolina e suas agruras pela luta do seu sofrido cotidiano – mas nunca deixou de escrever seus cadernos e tornou-se um beste seller com mais de um milhão de exemplares vendidos e traduzidos para vários idiomas, mas para nossa tristeza morreu pobre e esquecida.
Tirei as roupas de molho que estavam desde domingo, as lavei e as coloquei para secar no varal debaixo da caixa d’agua. A agua chegou no começo da tarde. Graças a Deus enchemos tudo, o tempo fechado ameaçava cair uma chuva e a bomba fica a descoberto no terraço. AS frieiras dos pés não deram moleza e eu as cocei até sangrar e depois fui queimar com leite de rosas. E para complementar um bom jazz de Milles David e Coltrane – depois um pouco de Waldick Soriano.

Fiquei como louco procurando o livro de Dillinger ontem a tarde no cafofo e não o encontrei, tive um principio de pânico e lembrei-me vagamente que o deixei aqui na oficina. Respirei aliviado ao vê-lo aqui na estante. Aleluia! Descia a Avenida Sarney Filho concentrado em meus pensamentos quando ouvi uma voz feminina do outro lado me cumprimentar:
- Ei, seu Constantino! – Era a simplesmente bela da rua 23.
Foi prazeroso contempla-la a caminho de sua caminhada. Uma bela ragatazza de 50 anos bem conservada – pena que não dar pra mim – o mesmo problema de sempre a falta crônica de dinheiro para banca-la. É melhor eu me recolher a minha insignificância e ficar devotado a literatura, quem sabe um dia o sol não brilha para mim.
“A pior bofetada para quem escreve é a devolução de sua obra por uma editora – escreveu a grande Carolina de Jesus decepcionada ao receber seus originais devolvidos pela The Reader Digest do Estados Unidos = Para mim foi assinar o contrato com uma editora e nunca ter o livro publicado aconteceu com meu livro “Tuberculose” que enviei por e.mail para a Artificios Edições e receber uma resposta positiva com o contrato uma semana depois – fui as alturas e até hoje nada. Mas foi bem legal, senti um escritor de verdade, faz parte de minha atribulada vida de ´poeta errante, mas em compensação assinei com a EDilivre de Paris e duas semanas depois recebi um exemplar de “Le Cahier Rouge du Pere Joseph” foi o máximo.
Um doidão radicado no Rio, primo da mulher de Juvan ficou interessado em comprar a oficina. Vamos ver no que vai dar, se for da vontade de Deus fazemos negocio. Pai Cardoso teve um piripaque e o filho Gordinho o levou para a UPA do Bacanga – espero que não seja nada grave. Desde segunda andava murcho depois que caiu da cama.
Monsieur Antoine, o negão das polpas de frutas insiste para eu soldar o carro dele, encaminho para outro colega – mas quer eu porque paga micharia -



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