
O que me fez ser
Data 06/11/2025 17:36:16 | Tópico: Poemas -> Introspecção
| Não foi um momento só. Não foi uma decisão nítida, Nem uma virada de chave. Fui me tornando — devagar, por entre frestas, Nos cantos onde ninguém olhava. Fui me esculpindo em silêncio, Porque falar doía mais do que calar. Quando criança, Aprendi a escutar antes de existir. Era mais seguro. Percebi cedo que o mundo falava alto, Mas nem sempre dizia algo com verdade. Então, fui silêncio — mas não ausência. Fui presença contida, esperando ser notado Sem gritar por isso. Fui os abraços que desejei e não vieram, As palavras doces que imaginei E precisei inventar para mim mesmo. Fui criando um alfabeto afetivo Só com o que sobrou. Meus afetos, aprendi a escondê-los Como quem esconde um caderno íntimo Debaixo da cama. Com medo que rissem. Com medo que roubassem. Com medo que amassem, E depois partissem. Fui me tornando alguém Que observa antes de entregar. Que oferece a alma aos poucos, Com mãos trêmulas, Como quem carrega algo frágil demais Para ser rejeitado. Hoje, se me perguntas quem sou, Talvez eu diga: Sou o que restou De todas as versões Que precisei abandonar para sobreviver. Mas há beleza nisso também. Porque nas minhas cicatrizes há mapa. Nos meus silêncios, memória. E no meu olhar, ainda vive Uma esperança tímida De ser amado sem precisar pedir. Poema: Odair José, Poeta Cacerense www.odairpoetacacerense.blogspot.com
Instagram @poetacacerense
|
|