O Que Fica do Que Fomos

Data 14/11/2025 18:36:27 | Tópico: Poemas

O Que Fica do Que Fomos
William Contraponto

Se um dia eu cruzar a noite inteira
e o corpo cansar do próprio som,
não esperarei por luz ou fronteira;
apenas o rastro do que ainda sou.

Porque além da morte não há segredo,
não há espírito buscando um lar.
Há só memória vencendo o medo
e o que deixamos no fundo do olhar.

O que fica do que fomos é o gesto,
é o nome lançado ao vento incerto.
Não é alma pairando em algum lugar,
é a lembrança que insiste em continuar.
E se eu não voltar, que seja assim:
no que construí, no que vive em ti.

Quando a última porta se fechar,
não haverá juízo nem muralha.
A vida é um barco que aprende a passar,
e cada travessia ensina – e falha.

O que chamam alma, eu chamo história:
a voz simples do que se amou.
É a cicatriz guardando a memória
de cada luta que alguém lutou.

O que fica do que fomos é o gesto,
é o nome lançado ao vento incerto.
Não é alma pairando em algum lugar,
é a lembrança que insiste em continuar.
E se eu não voltar, que seja assim:
no que construí, no que vive em ti.

Se deixo um verso solto pela rua,
que seja luz pra quem quiser seguir.
Não há mistério entre sombra e lua:
há só a marca do que se quis sentir.
E quem nos guarda não é o além,
é quem repousa o nosso bem.

No silêncio que sucede o último passo,
ninguém nos chama para salvação.
O tempo recolhe o nosso espaço
e entrega aos outros a continuação.

Se algo vive depois do adeus,
não são anjos nem eternidade:
é o que plantamos no chão dos seus,
a parte nossa que vira verdade.

O que fica do que fomos é o gesto,
é o nome lançado ao vento incerto.
Não é alma pairando em algum lugar,
é a lembrança que insiste em continuar.
E se eu não voltar, que seja assim:
no que construí,
no que vive em ti,
no que chamam fim
e que eu chamo de existir.



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