A flor-de-lis

Data 22/02/2007 00:34:32 | Tópico: Contos -> Infantis

A flor-de-lis

Numa tediosa tarde de Agosto, dois amigos encontram-se por acaso num travessa da velha vila de Montargil. Pertencentes ao corpo de escutas local, já tinham vivido mil aventuras em conjunto. Ficam parados ali mesmo a reviver os momentos de acampamentos passados, a desvendar as futuras sortes…
João trazia uma blusa com o brasão dos escuteiros, no qual se destacava a flor-de-lis, a qual para ele aos dez anos de idade despertava a maior das curiosidades, e desejo por conhecer sua beleza que não pelos livros e enciclopédias da sua escola. A famosa “Sprekelia formosíssima”, que por ele era idolatrada. Seu avô chegava mesmo a dizer em tom de brincadeira ser o seu primeiro amor, o que enfurecia João pois seu coração era de Ana outra membro do seu grupo restrito de amigos.
O sol queimava, e fazia levantar do alcatrão uma espécie de fumo translúcido visível a olho nu, como se este tivesse a derreter, sucumbindo à força do sol, e evaporar-se tal como a água.
Foi então que Gonçalo sugeriu que procurassem a sombra amistosa do café central, ponto de encontro deste aventureiros de palmo e meio, que Ana já estaria por lá. Para João não bastaria dizer mais uma palavra, se falou de Ana era o suficiente para o fazer deslocar até ao ponto mais distante que suas pernas o podiam levar, ainda não tinha noção mas estava a viver algo que para sempre iria recordar, por mais anos que seu respirar se prolongasse, era a sua primeira paixão, não entendia bem o que isso significava, mas não se importava era com ela que queria dividir as suas aventuras.
Chegando lá, pediram o refresco do costume, e sentaram-se ao lado de Ana, que estava a espera de Gonçalo para fazerem o trabalho de grupo sobre a poluição e seus efeitos nefastos para a fauna e flora.
João não participava neste grupo, pois tinha reprovado no ano anterior.
Agora o trio estava completo, ao porem Ana a par do seu assunto de conversa, esta diz ter estado a falar com um pedinte que pousava na porta da igreja pedindo esmola, e que este lhe havia dito que a flor-de-lis nascia nas margens da barragem banhada pela luz da lua.
João não podia ficar mais excitado, e decide que essa noite iria procurar o seu objecto de culto, a famosa flor-de-lis utilizada desde há séculos para os mais diversos fins, em especial na França medieval que chegou mesmo a ser o símbolo real, flor-de-lis símbolo de pureza que inicialmente representava a Virgem Maria, no escutismo segundo Lord Baden-Powell simboliza paz e pureza, e que ainda hoje faz parte da bandeira do Quebec.
Gonçalo diz imediatamente que não pode, mas ao ver que Ana está interessada começa a recuar nesta certeza, e em breves minutos decide também partir em busca da lenda que o pedinte havia descrito a Ana.
Os três amigos abandonam o ar enfadonho e monótono do café central, combinando logo mais ao nascer da lua se encontrarem nesse mesmo local.
Nasce uma lua redonda e brilhante iluminando a igreja matriz com seu relógio falante, e demais Montargil, projectando sua sombra pelos vales que a rodeiam.
João é o primeiro a chegar mal conseguiu jantar, não fosse a sua mãe a obriga-lo a comer a sopa e nada traria no estômago.
Lentamente aparece Gonçalo na companhia de Ana para desespero de João, que já não aguentava de ansiedade, mas o atraso foi justificado por a necessidade de Ana ter tido de voltar a casa buscar um saco para apanhar amostras de poluição nas margens da barragem para o trabalho de grupo.
Seguem os três amigos donos de uma verdade absoluta que não vem nos manuais escolares, porém nas suas mentes de tenra idade não podia ser mais plena.
O caminho é breve, os barulhos nocturnos permanentes que assustam mas não demovem o grupo da sua demanda.
A lua atinge o seu auge e a flor-de-lis tarda em aparecer, em vez disso a busca de Gonçalo e Ana é recompensada com beatas, sacos de plástico, garrafas de bebida, latas de conserva, e todo tipo de resto de comida que os veraneantes deixam ao abandono depois de não lhes servirem mais.
Os três exploradores constatam que apesar de estes restos serem prejudiciais para a flora local, alguns animais acabam por beneficiar alimentando-se deles. Mas também que é o Homem que suja, quem mais perde com o seu não reaproveitamento, com a sua não reciclagem, não tirando valor do que se pensa já não ter erradamente…
Mas não há o menor sinal da misteriosa “Sprekelia formosíssima”, o que desalenta por demais João, pois o passar dos ponteiros do relógio chama-os a todos para seus lares e a subida à vila ainda demora um pouco.
Tristes mas com a consciência que tudo fizeram para concretizar seu sonho, voltam a suas casas pensando na próxima aventura que os unirá em torno de um só objectivo “a amizade”.
Nesta noite estes três lobinhos aprenderam uma grande lição, não dar ouvidos a desconhecidos por mais verdadeiras que possam ser consideradas suas histórias. Ouvir sim sempre as palavras da sua pioneira Andreia que lhes farta de dizer nos acampamentos:
- Permanecer “Sempre Alerta”.

Fim




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