ELEGIA PARA UM CERTO JÚLIO SARAIVA

Data 15/07/2008 22:33:47 | Tópico: Poemas

aspiro o pó dos meus dias
organizo a festa da noite seguinte
num baile de máscaras dancei com a morte
a lua cheia me salvou
minha loucura meu bem é quase santa
por isto estou sempre a rezar
tenho palavras de missa na ponta da língua
mesmo quando blasfemo estou a rezar

aspiro o pó dos meus dias
sou eu mesmo o meu maior inimigo
firo-me diariamente com o punhal que trago nos olhos
depois vou dormir tranqüilo
certo do dever cumprido

aspiro o pó dos meus dias
constato que fui poeta aos 20 anos
hoje sou apenas a cópia cruel dos meus ontens
abomino a palavra desprezo o verso
e descubro-me sozinho
parado na esquina a fumar o último cigarro

aspiro o pó dos meus dias
o poeta que fui aos 20 anos morreu
numa noite qualquer de mil novecentos e qualquer coisa
envenenado de soneto nos braços da mulher
que nunca existiu

_________________

júlio, 15-07-08


Este texto vem de Luso-Poemas
https://www.luso-poemas.net

Pode visualizá-lo seguindo este link:
https://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=44361