SONHO DE BENTA DE AGUIAR
Data 19/07/2008 06:21:57 | Tópico: Poemas
| Sonho de Benta de Aguiar
Beati mortui, qui ni Domino moriuntur
1.
há um cordeiro preso ao ventre do vento que erra ninguém escuta o seu balido a sua súplica dar-se-ia em sacrifício pelo rei que vacante deixa o trono
2.
uma opala esventrada onde o grito da mandrágora incendeia o mel rente à tez de uma palmeira é cinza ou sombra é dânaca na boca do devir
3.
escuta uma safira fendida habita na voz de um espinho de acanto escuta o seu grito que o vento na pedra esculpe
4.
vê onde o sal se entrega lúcido ao corpo do mar vê as mãos que nascem para a colheita das lágrimas
5.
ao longe um lírio do vale dá-se às chamas de um perene loureiro que de encantado cai tentado pela própria sombra
6.
e sangra uma orquídea tomba na planura junto à tumba de uma pomba coroada de espinhos quando ainda alva era a baga da amoreira
7.
desenha-se a escada após o arco onde brotam jacintos violetas mas o olhar repousa no dorso de uma corda esquece a chave esquece o pó a via
8.
reclama as mãos a boca o fruto da beladona reclama o gesto que as mãos inventam para saciar a boca enamorada por um olhar
9.
na ara onde o pão e o vinho se revelam para o mistério das anémonas três peixes em círculo se esboçam em sangue feridos que estão por sentirem o corpo em queda de um narciso
10.
um cometa incendeia o coração das noites e dos dias da ventura com seus ígneos cabelos que entre as unas mãos ergue o canto supremo de um supremo desígnio a cumprir
11.
veio de ouro e prata de pedras preciosas de marfim esta rosa amarela qual sereia que canta a fortuna que oculta e enfeita a desgraça
12.
tomba o ceptro sobre o manto desfalece o arminho o globo fende-se na oferenda da rosa a mão dextra quando a sinistra afaga o trono onde vacante a coroa jaz
13.
há passos cansados gravados na areia são passos que avançam órfãos de um norte que tendo não têm são passos dados em redor da glória que o destino dos passos negará
14.
semeia-se a vasta terra com o silêncio onde antes o ferro reclamava a herança que o martelo na bigorna lhe legara em rubra condição
15.
há ciprestes frondosos onde o olhar se estende pelo campo da peleja e três sombras duas de negro erigidas e outra de ignota color que de seus sólios se ausentam
16.
mas ergue-se um carvalho na distância na exacta mesura da espiga de trigo e sentem-se os passos na conquista da luz da serena luz que brota do sulco de um arado
17.
um tempo que se escreve pelo tronco de uma faia fulge no olhar há um lebreu que se ergue contra a loba promete e planta a delicada flor do jasmim
Xavier Zarco www.xavierzarco.no.sapo.pt www.euxz.blogspot.com www.xavierzarco.blogspot.com
|
|