Há sempre um lugar mágico no cais dos meus pensamentos

Data 28/07/2008 23:10:24 | Tópico: Prosas Poéticas

O lusco fusco era a hora perfeita. Desliguei o botão do aparelho que me obrigava a permanecer no mundo real e voltei ao meu lugar secreto, para onde fujo sempre que posso, levada pelo embalo dos meus pensamentos...
A lua já tinha subido meio palmo no horizonte, desde a sua silenciosa chegada. Ali estava ela, imponente e divina! A deusa daquele céu imenso, de tom alaranjado, agora ainda mais belo, à medida que a lua o ia banhando de prata.
Aproximei-me vagarosamente da janela do tempo e debrucei-me sob o parapeito das minhas lembranças, que, subtilmente, me levaram para um lugar tão distante dali...
Revisitei-me numa outra vida, vivida em segredo e há muito tempo. Secretamente guardada num baú invisível, qual tesouro pirata que só eu sei onde está.
Ali fui até rainha! A rainha de um estranho reinado misterioso. Só meu!
Nesse reino onde havia também um escravo... um servo que, quando queria , sabia ser dedicado, ao ponto de me fazer sentir especial sem o ser... a cumplicidade era o nosso reino cheio de regras impostas pelo meu sentimento. Ainda sinto o perfume do pecado no ar... o sabor adocicado do proibido... onde a loucura tomava as rédeas da envolvente sedução, desbravando os caminhos que nos levavam até aos limites do irracional...
Mas houve um dia, que o orgulho falou mais alto e compreendi o quanto ele pode ser severo e cruel, desencadeado por um outro sentimento, que eu sabia existir em mim, mas não nele. Pois ardi muitas vezes, nas labaredas do ciúme, que me consumiam a alma até mais não poder. Sofri tudo isso em silêncio, sem nunca mostrar um só sinal de sofrimento, transformando as chagas em sorrisos. Talvez pelo medo do abandono ou para que não acordasse essa negra sombra, que pairava sob o tecto do meu sentir. Não, não a queria acordar por nada deste mundo, mas sabia estar ali, sempre presente, como um vírus latente e pacientemente à espera de uma oportunidade. Achava-me forte!
Mas há sempre um fim para tudo. E o dia do fim daquele meu reinado, tinha finalmente chegado pela noitinha. Naquele dia soltei as amarras que me prendiam a algo que no fundo e desde o início, eu sabia ser uma ilusão…
Fiquei livre, mais leve e muito mais solta. Aprendi uma grande lição; não se pode querer o que não nos serve!
Pouco a pouco, fui ganhando aquela força que me ofereceu a confiança. Aprendi de novo a ser EU!
Não foram as saudades, mas foi para lá, esse lugar meu e já tão distante, que o pensamento me levou hoje.
Já de regresso ao mundo real, retomo as tarefas banais de mais um fim de dia, tão igual ao de ontem, e talvez, tão igual ao de amanhã... até que chegue aquela hora mágica, que me levará mais uma vez, ao cais dos meus pensamentos. Num outro lugar, num outro tempo...




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