A Percussionista Do Agreste

Data 24/08/2008 23:33:54 | Tópico: Textos

A Percussionista Do Agreste



Tia Aracy com y, era uma pessoa que mandava na minha alegria.
Ela possuía uma gargalhada muito distinta das outras, tão forte que das esquinas se ouvia ,e quando cismava de contar suas histórias do sertão,o mundo todo ia abaixo,porque também fazia uma interpretação precisa.
Ora era Lampião confabulando com Maria Bonita,ou de Antonio Silvino dando ordens aos jagunços,o fato é que,apesar dos momentos de medo,o que se via no fim, era pura graça e um tanto de gente aplaudindo.
Cismou de me ensinar a tocar com duas colheres, a tirar ritmo de prato, de frigideira, não precisava de triângulo, zabumba... nada disso apetecia ,era uma espécie de Hermeto Paschoal de saias, sem sequer saber disso...
Acabei tomando valiosas aulas por conta de sua percussão nata. Assobiar, sabia como ninguém, pois treinara com as aves lá do seu agreste paraibano.Certo dia -me falou- seu trinado estava tão parecido com um trovão que a criançada corria anunciando a dádiva divina. Imaginem como é isso para uma gente que vive esperando a chuva.
Ela era porém, uma mulher desgostosa nas questões do amor, pois havia tentado três casamentos e nenhum deles vingou.Será por que, vivia se perguntando por entre os dias. Mas logo depois se acalmava e aquela senhora musical e divertida por natureza,voltava ao comando.
É preciso dizer que sua fama começou na feira de Gado Bravo, onde sua mãe Zefinha era a principal atração com as comidinhas e o famoso café. Lá, ela ajuntava uma roda de gente para ouvi-la cantar um coco arretado, sempre acompanhada de suas colheres e com a ajuda do coro que aparecia de última hora, por conta dela e da qualidade da comida,é certo; os negócios iam de vento em popa.
Um dia apareceu na casa de dona Zefinha, um sujeito sério com ar de poucos amigos, querendo namorar a tia Aracy e todos ficaram contentes por ela, que finalmente teria a possibilidade de ser feliz. Conversaram muito e resolveram engatar namoro, foi uma gozação com a criançada, os moços de casa faziam troça com ela, mas o tal havia conquistado também a dona Zefinha que fazia gosto num casório.
Desse modo foi que ficamos todos sem aquela Tia Aracy luminosa, porque acabou se tornando mesmo uma dona de casa muito prendada, quase babá -dizíamos- do seu Tulú,como era chamado aquele que ao desposar minha tia , levou a cantora da casa,a única que entoava um coco ligeiro como o vento,e que agora só queria saber das vontades do marido ciumento
Assim se foi minha adorada maestrina dos pratos, mas não sem antes me ensinar a tirar som das peneiras...




Nina Araújo




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