A todas as mulheres

Data 28/08/2008 21:09:07 | Tópico: Homenagens

A todas as mulheres que me fizeram bandido
A todas as mulheres que me levaram os últimos trocos
A todas aquelas que adivinharam minha sede entre roupas
A todas as musas que se ofereceram para ser tinta no meu papel
A todas as hortênsias e papoulas que nasceram nas tabuinhas da minha carne

O meu muito obrigado Pela tintura que me destes
Pelas serenatas com músicos de barro
Pela viagem sem ter de pagar ao motorista
Pelas ilustrações na parede do meu prédio

O silêncio não é um jogo de cabra-cega Nem um estojo sempre mudado
Ele é o senhor que ao ouvido me relata a guerra

Haja Marias para distribuir pelos Manéis!
Haja água salgada a pedido da astrologia!
Haja montes como este que carrego!

Por todas as mulheres declaro nas finanças um milhão de dólares
Aos seus filhos ofereço-lhes cravos para mais tarde interpretarem
Aos filhos dos seus filhos aqui vai um verso isento de electrónica

Assim que vos vejo corrijo o estrabismo
A noção que a água é líquida é desfeita a dúvida
Entre a cabeça e o sapato levanta-se a vítima
Não me tentem compreender
Foi dessa forma que meu pai se matou

Deixem a compreensão para depois do adeus
As ligaduras são só para evitar vertigens
E os marinheiros em coordenadas são analfabetos

A poesia é uma mulher com o egoismo levantado
É meu sinal da cruz antes de dormir
É a saia onde os poetas assoam seus narizes

As mulheres são frutos que nasceram de uma ideia genial
São o que agora não me ocorre

Se o tempo fosse materialista onde dormiriamos esta noite?
Se o gafanhoto fosse um instrumento musical quem cantaria?
Se o sonho fosse desvandado O Homem abria negócio rentável
Pelas cordas Pelos nós havemos de chegar ao céu
E cuspir na cara do senhor que nos vier abrir a porta

Às mulheres que nas suas ofensas excluiram o meu nome
Às entendidas que a partir de beijos fazem rolinhos de carne
Às egoistas que quiseram ler meus versos antes de irem ao batente
Chorai agora
Digam está bem aos vossos fantasmas
Porque hoje farei história quando abraçar os meteoritos
Quando a santa igreja perder este seu fraco contribuinte
os sapos sobre mim acasalarem
e sobre uma carica-voadora avistar a Terra do Longe

Hoje estarei a tomar o céu por uma palhinha
Que o gado silencioso me ensinou
Terei as mãos para me condenar
E os ouvidos com a táctica do monge

A vida é um mosaico mal interpretado
Uma vela com mais cera que pavio
É um barco puxado por animais de estimação

Antes que meu corpo seja um punhado de bróculos servidos à mesa
Vou arrancar a medicina do coração
A psiquiatria circular da cabeça
A geografia intensa das veias
A matemática lírica das plantas dos pés
A safada moral dos meus punhos cerrados
A literatura do meu sexo E aí serei homem sem PH
Um masturbador nas horas vagas

À Rosa dos Limões que me engomou a camisa aos quadrados
À filha do Moreira que me trouxe duas colheres de chá
Ao polícia que não me perguntou aonde vais
À saudade que me tirou o gesso da alma
Eu tenho sangue e curas para vos dar
Tenho três balas na câmera para jogar à roleta russa
E mais um sentinela que não cobra nenhum

Quereis o sonho dentro de prata de alumínio?
Ou guardado debaixo da pata de uma égua?
Esqueçam os meus lamentos E democratizem vossos rebentos
Achem novos caminhos
Anulem a vénia dos arcebispos
E toca a sofrer de amor Que é desse modo que as abelhas vão fornicar
E se multiplicarem para produzir o mel que tu gostas tanto

Deste meu quarto andar só vejo comboios partirem
As pessoas são visitantes que vieram ver a mulher-barbuda
O meu canário recebe o correio e assina
O meu gato escolhe o canal televisivo
A minha anaconda é boa almofada para dormir
Eu sou o resumo do que queria ser:
Uma bandeira a servir de toalha!
Um acrobata com medo das alturas
Um sonhador a precisar de descanso

Vai daí que o mar é ateu E as ondas são ondas
O silêncio é uma pousada para toda a idade
E as estrelas mais pretendidas são feitas cá na Terra
Nos intervalos da guerra

A todas as mulheres devo o sonhar com varandas renascentistas
Foi por elas que o meu orgulho deu três pipas
A todas as mulheres que escolheram o tom dos azulejos
Não temam a ementa que o mar salgado tem para vos dar

Está na hora de apertar os cordões e ir
Lá em baixo o vento faz o seu desastre
Caminho por onde os pecadores rasgaram a fé
Ponho os pés onde era suposto ter lá um lobo a sofrer
Mas nada me prende à saudade Nem tão-pouco às cordas do meu cavaquinho
Deixo-vos os meus filhos de várias cores
De várias nações e de todas as línguas
Deixo-vos rapazes e raparigas como matéria-prima
Para se fazerem homens verdadeiros
Com pernas pertencentes à terra E olhos com poemas agarrados
Façai da minha pele morena o lençol para embrulhar o menino quando nascer
Não se incomodem com a música triste
Eu hoje serei fita de cromo arrancada da cassete para dar vinte voltas ao mundo

Não me choca não ser ouvido
Choca-me sim saber que há meia dúzia de galos que querem comandar todos os galinheiros!

Mulheres de todos os meus escritos! Invadam as assembleias E corrijam todos os artigos!
Porque eu
Estou quase
A minha barba já pica
Os meus braços endureceram
E há quem já me trate por senhor
Quando eu
Sou apenas aquele que vos está a escrever
Nesta varanda Tunisina que comprei em Marrocos
(Numa tabacaria para loucos assumidos)
E que anda sempre comigo para qualquer lado que eu vá


p.s. este texto está incompleto



Este texto vem de Luso-Poemas
https://www.luso-poemas.net

Pode visualizá-lo seguindo este link:
https://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=50175