A Calúnia e o Roubo do Canto

Data 31/08/2008 19:40:00 | Tópico: Contos





-Véio Bino, mas por que então o cara não percebe? Bastaria ver que eu continuo pobre! Se tivesse ganhado uma bolada de dinheiro como ele diz, já teria partido, não é isso?
-É provável meu filho, mas ele poderia também achar um milhão de outras coisas e a cabeça da gente ia dá nó só imaginando.
-Não entendo o que o senhor quer dizer...
-Ouça bem o que este seu véio amigo dirá, porque ele já viu muita coisa na vida e no mar. O rapaz conheceu você, sabe que é um jovem músico pobre, conviveu com sua família por algum tempo, não?
-Sim claro, freqüentou a minha casa durante quatro meses- assentiu Ênio
-Pois então ele conviveu com vocês quase que diariamente por esse tempo, vocês fizeram várias composições juntos, sabe que não é a pessoa talhada para ser um espião encomendado,não é frio nem calculista, alguém pronto para ser “infiltrado” e prejudicá-lo assim. Ele pode dizer que você vendeu o solo para o tal moço, pode pensar que de fato você conhecia o empresário inimigo dele todo o tempo, por conta dessas coincidências do número de celular, mas o fato é que ele não averiguou nada, não quis se dá ao trabalho e tudo está claro lá naquela cabeça, porque é da natureza dele fazer mal juízo das pessoas, talvez porque já tenha sido muito lesado, talvez porque não quer sofrer. Tem gente assim... O que importa é você continuar sereno, filho. E mantendo a calma.
-Sim, estou calmo. Só que até lá ele está pensando que sou ladrão.
-Mas você não é... E não teve culpa se ele não quer se esforçar para ter a verdade. A questão do número, por exemplo, ele não verificou, se sumiu a fita ele facilmente acusou você, é o costume.
-É ele cismou que o celular que eu ganhei da dona Carmem tem o mesmo número do seu arquiinimigo, que culpa eu tenho disso?
-Nem deve ser meu filho, e se fosse você tem como provar que ganhou de presente antes de conhecê-lo...Tudo é muito claro, está havendo má vontade da parte dele, mas não se preocupe um dia a verdade aparece e voce se sentirá melhor porque livre já é, imagina um moço talentoso como você roubar algo de alguém, um moço tão bem criado, cumpridor de seus deveres, imagina se ia se vender assim. Ele está avaliando você pelo padrão que conhece, fique tranqüilo Ênio...
Meu pai diz que o senhor é o melhor pescador de almas boas que o mundo tem e é mesmo véio Bino!!
-Viva sua vida tranqüilo e nem vai acreditar que passou por isso, talvez esteja acontecendo assim dessa forma porque ele precisa de uma lição, ou ambos, não é mesmo?
-Eu??? Meu véio...o senhor não acabou de dizer...
-Sim filho, mas é que às vezes precisamos de testes para ver como estamos , não é de todo mal... nada é...
-Caramba!
A conversa com o amigo pescador foi difícil mas a partir dali os dias ficaram leves para Ênio que se concentrou no trabalho e com dedicação e sorte foi galgando os espaços na música, sua grande paixão.
Passados três meses aquela história havia tomado outro rumo, um taxista achou a fita com o endereço e entregou na casa do ex-parceiro de Ênio com a justificativa de que não entregara antes por falta de tempo, naquele momento ficou comprovado que o rapaz era mesmo inocente e o tal numero de celular igual que Paulo se valia para acusar o ex-amigo e parceiro musical, descobriu-se meio que por acaso, que não tinha nenhuma relação, nem mesmo os números eram idênticos, apenas muito parecidos. Quando Paulo voltou à casa de Ênio para tentar que este lhe aceitasse as desculpas soube da viagem e muito triste despediu-se dos pais dele .
Caminhando até a praia se lembrou do véio Bino, pescador amigo de Ênio e resolveu conversar um pouco para saber de novidades.
-Então o senhor está sabendo da viagem?
-Sei que ele foi para Minas ganhar um prêmio pela música que ganhou o festival, foi muito feliz!
-Que bom! O senhor gosta muito dele, não é?
-Todos gostam! Ele dá motivos para ser assim.
-É verdade. Eu vou indo até um dia, senhor Bino!
-Moço?
-Sim.
-Fique calmo! Não se apoquente, porque a vida sempre acha um jeito de consertar o que vale à pena ,viu?
Paulo se despediu torcendo para que aquela fosse uma boa verdade, dita pelo velho pescador.



Nina Araújo.



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