
Um cisne a luzir na escuridão da noite!
Data 22/09/2008 11:33:12 | Tópico: Frases e Pensamentos
| É no teu colo que a paisagem se torna maior É no teu sorriso que a confraria busca ideias É na toalha quente da noite que o poeta constrói seu palácio É no embrião da noite que Jesus Cristo sobe a rua numa jangada
Mas, o que é o Ser se ele não é nem pode ser? Que culpa têm os mortos de não poderem falar sobre as orquídeas cheirosas? Que profecia tem o Sol quando não nos enamora? A verdade é apenas um utensílio que o poeta traz ao peito Um fósforo capaz de acender sua chama debaixo d’água Uma grua que faz a ponte entre-luas
É no verso da noite que o silêncio é contrabandista É no som da espingarda que as rimas são fracas É no paladar da cegonha que se adivinha mais um filho É com a cabeça dentro do poço que se escuta o avanço do mar
Mas que adianta se a lua é uma bujiganga vista aos meus olhos?! Ou se os dias cinzentos são apenas lugares comuns?! A escuridão pode ser um elemento decorativo deste Teatro Mas a noite não! A noite é um território a decidir! Os amantes que falem!
Quem quer comprar a noite repleta de poetas e malabaristas? Quem partiu o dia em dois sabe que o amor não entra na contabilidade Sabe que o Homem é mistura de várias cores primárias Sabe que as curvas não se endireitam ou se se endireitam É porque sobre a pele traçam-se rotas de fogo É porque o arqueiro treina de noite e de dia a sua astúcia
Entendes o dialecto do cigarro quando se consome? Não?! Então experimenta o salto para uma roseira Com o delírio a juzante do pensamento Reduz o céu a um lápis e a uma sebenta E nela escreve a noite e a escuridão com a fome de quem padece Com o grito que agora é já a mulher com quem te deitas O berbequim como última penitência A virgindade das raparigas extraídas num assobio de macho valente
É na poltrona matinal que o incerto desata o fardo É na manha do esquilo que se monta o esquema lunar É no prelúdio do beijo que o chão mais parece um tapete persa É na neblina sedutora que abrimos o peito e tocamos a conga
Tenhamos a orquestra sempre a nosso lado Bordemos o pano antes que a velha Esperança se deite a valer Transporta o piano para o mar alto com o cuidado de uma parteira E toca a noite e a escuridão dentro da mesma mortalha Toca a fome e a sede na boca operária do poeta
Os bandidos também padecem de incertezas Os umbilicais conduzem-nos à nascente Ó que viagem tão peninsular és tu ó Noite! Meu quartzo dependente! Minha esposa de trocar lamentos! Quem diria que só o Sol é quem nos afasta... Quem saberia falar de ti para além dos poetas malditos?!
O teu traje de luar mandaste-o fazer ao cabo do mundo Os teus olhos de ameixas não há Egípcia que os copie Tens um colo que eu reconheço pela intensidade do faro: Após vida inteira a cheirar pétalas e pétalas Ó escuridão que poema te hei-de eu dar senão estes trechos de bicho a espreitar a toca? Que mania tem a sombra de se parecer com o seu proprietário? Se a noite é uma mulher como lhe pegar na cintura?
É na multiplicação das aves que o teu véu se produz É na história sem fim que o anel cabe no dedo e jamais de lá ele sai É no redemoinho do vento que nos parecemos irmãos É na fé das buganvilias que eu corro para te ver
Que seria da noite sem a escuridão? Que ilusionista tira o céu de uma cartola? É justo não haver justiça Senão o que seria dos que se amam às escondidas?
Ó noite posso perder toda a força mas o teu cântico não! Posso enterrar todos os vícios mas a tua vontade sobrevive! Talvez o absolustismo seja a tua veia solene Talvez a estrela maior seja o nosso apartado Quando às sete da manhã te vais a âncora toca no fundo
A noite é um grande cinema em que as cabeças estão duas a duas É a loja sempre aberta onde o porteiro é um anjo pouco decidido É o grevista que nos acompanha para todo o lado
Ó noite de famas glórias Que partido é o teu senão o nosso? Quem te pôs escamas no dorso para que brilhes ainda mais? Quero-te toda em versos a meu lado Quero inventar-te um vestido com a saliva que me resta Quero arranjar um prego que nos unifique sem magoar Porque tu nunca me sobras Nem com lábio descaído Não te derretes Nem com a voltagem do grito Ó noite de várias comungações! Ó fruto escolhido da escuridão! É de ti o meu agrado A alucinante navalha que risco Liberdade As papoulas que me salvam da fome do jantar
Sempre que o mundo se afasta ficamos mais unidos Tocamos a corneta e os pássaros logo vêm À gruta do nosso sossego Que é este nosso coração nocturno De sedas revestido
Que seria da noite sem a escuridão? Que fato Deus mandaria fazer senão este que ela tem? Que ovário pariria a sua luz de Natividade? Confesso que à noite passeio pelo bosque do meu pensamento Que desligo o cérebro e canto ao ritmo da nascente
Sou uno no meu relógio visceral Um migrante do quarto para o pátio e do pátio para o curral Sabes porquê ó flor do meu comércio?
Porque a noite é o espelho em que me demoro E retoco a farsa para o dia de amanhã É o vinho que o taberneiro diz sempre que não há É a mãe-preta que se preocupa se eu já inventei o amor E que me põe o dedal para escrever assim Que me põe a sorrir tal a perdiz que se escapou E me deixa feito cisne a luzir na escuridão da noite!
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