
A UMA MULHER CHAMADA RUTE
Data 05/05/2006 15:33:58 | Tópico: Poemas -> Reflexão
|
Ela não sabia nada da vida, Fora mãe ainda uma criança, Rute, uma simples rapariga, Há muito perdera a esperança.
Dos homens que conhecera, Nesta sua breve caminhada, Apenas um a enternecera, O mesmo que a olvidara.
Moça simples e de costumes, Da aldeia que a viu nascer, Partiu assim, por serras e cumes, Certa manhã, num amanhecer.
E há cidade grande já chegando, Com a menina pela mão, A ambas foi-se deparando, Uma estranha sensação.
Tudo era como num imenso desafio, Dos prédios como gigantes, Aos carros num rodopio, Parando nos passos distantes,
Dos que passavam sem olhar, Homens em louco frenesim E animais a se desgarrar, Nada ali parecia ter um fim,
E quanto mais elas caminhavam, Quanto mais as saudades diziam, Mais e mais, se embrenhavam, Nesse grito que ao longe ouviam,
Do quarto escuro e sem cortinas, Alugado na única das pousadas, Aonde todas as coisas eram permitidas, Da vileza às ratazanas nas escadas.
E foi assim que a manhã se realizou, Por ruas estreitas e portas fechadas, Rute, bem que se esforçou, Mas de tantas oportunidades negadas,
Breve o sonho a fez temer: Sem emprego e sem dinheiro, Sem ter o que levar que comer, Pensava na filha, o dia inteiro,
Esperando por ela no lúgubre quarto, Na esperança que sua mãe viesse, Trazer-lhe o que pôr no prato, Por aconchego ou pura benesse.
Afligida por tamanha afronta, Má mãe então ela se julgou, E fazendo jura, pôs-se pronta, Guardou a cruz e caminhou.
Desde então, velhos e relhos, Por sua repulsa e farto engenho, A quiseram assim, de joelhos, Como no rosto o cenho,
De dias carregados de miséria, E no corpo o transtorno, Dos que, chamando-te de galdéria, Eram o teu próprio e triste abandono.
E as noites sobrevinham aos dias, Como os dias eram com as noites… E nem o álcool nem as fantasias, Calavam nunca a brutalidade do açoite.
E pensavas na tua pequenina! E aceitando a ignóbil do homem, Logo tornavas a fálica esquina, Aonde todos os sonhos se consomem,
Na aturada omissão de quem passa, Sem ter o que querer nem saber, Na pressa descuidada, rumo a casa, Passo apressado, que não quer ver.
Rute, uma simples rapariga, Que fora mãe sem ser criança, Sabia bem o que era a vida, Por isso tentara a mudança,
Na esperança vã de um novo dia, Tomando rumo que dar à filha, Talvez mesmo um pouco de alegria, Mas dos outros a partilha,
Foi só esse imenso desprezo, Que rasga e prante e dói na alma, E mais ainda que fogo imenso, É lume brando, em doída calma.
Rute, morreu só, sem honra Nem dos outros o respeito, Mas nossa é a vil desonra, Como dela em nós o despeito.
Jorge Humberto (06/03/2004)
|
|