FORA-LHE DIAGNOTICADO CHUVA

Data 16/11/2008 21:49:18 | Tópico: Poemas

FORA-LHE DIAGNOTICADO CHUVA
chovia dentro do seu corpo como típico novembro
folhas tristes: caranguejos em sobressaltos

frutos envenenados luziam em fogo posto nos cabelos
amores caiam-lhe aos cachos
e os ratos vinham por aí
construir seus reinos
seus rios que vão dar às omoplatas

o bruxo mandou o doente se retirar
suas unhas luziam como pérolas extraídas do sono
qualquer coisa fenomenal
sangue que não nega o corpo: música lírica derretendo aço

e o doente entristeceu-se
suas memórias vasculhadas a martelo
olhar de mocho a controlar os movimentos
do braço que fura o fogo
do peito que recebe fracas notícias por uma rameira

olha o tempo com imperfeição
uma gangrena escorre limpa e serena
sete bichos acampados no crânio esperam
a intermitência
há tanto a traduzir e ninguém é capaz

chove por dentro dele
sua carne ensopada ofusca o vitral
e quem se rir terá a sua chuva pela certa

devemos concluir o vector da existência
correr o fecho das galáxias para não mais
completar o século com os vulcões vazios
depois subir
com a calma de uma velhice
num suicídio
que demora a procriar

o que é o cérebro se não escuro
tinta que sobra das plantas comilonas

funerais só depois das nove da noite
que é quando o brilho assa e o morto comporta-se como morto
a demência não entra na tributação
nos cálculos da primavera
outono sim
é mês de cozer o pão entre as palmas das mãos
uma casa possessiva com ataques de nervos

e por que cai água nos regos cerebrais
O louco nada pelo ar em movimento de gibóia
Lento
Comprometedor
Como quem afasta o lodaçal com as arestas dos braços
Afiadas
Bilhantes como tudo que ilumina a gota


Chamam-lhe palhaço
Sorriso de alicate
Infiltra-se a chuva por dentro de alguém
Amamenta a loucura com sémen da sua paz
E dobra-se
Desta vez não espera pelos deuses à saida da taberna

Fecha-se em guarda-chuva – na sua verdade
Reparando feridas com o maçarico dos sonhos –
Intermitência - mas hoje ele não vai ganhar.



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