Entre a terra quente e o mar vazante

Data 23/04/2007 23:06:31 | Tópico: Poemas

Entre a terra e o céu, esgueira-se fausto
um rio oferto de búzio ocos.

Devassa-se a miragem, doce e virginal -
inocuamente privada - de um espaço aberto,
onde estrelícias de jardim disputam,
a pureza inicial do primordial movimento,
no bailar com esguias estrelas-do-mar.

Em danças tangentes de ventos e dilúvios,
no redondel d' inundas fogueiras
de fogo já carbonizado.

Entre a terra quente e o mar escorrente,
corre um deserto aberto a navegar-se…
Em línguas d’areia arenosa. Granulada.
Eleva-se em cilindros a atentar com a calma
marsupial das estrelas, perdidas na estrada do sol.

Entre a terra quente e o mar vazante,
em águas nunca acabadas, segredam-se lentas
madrugadas judias. Buscam-se em papoilas resolutas,
quando de lá da serra ventam águas redemoinhas
na fome de beijar desabrigadas bocas.

Nas horas loucas em que galinhas poedeiras
chocam horas de relógios envidraços.
Sem sentido…

Entre a terra e o céu, matilhas de cães vadios
abocanham marotos, atacadores de sapatos rotos…
No momento em que os lenhadores disseminam no corte
o sobro e em que as comadres se ungem a noite inteira,
em efusões de nupciais flores.De flor de laranjeiras.

No instante fatal em que o Sol estonteou no cio ali ao lado
no colo sazonado da sensual sementeira.

Entre o céu e a terra escorre-se como quem morre,
o peso irrequieto da demora – de dar ramo, ramificação,
de dar o corpo, a alma e até mão… de dar completo afecto.

Falha, toda a natureza se revolta. Acocorada,
agora, rente de si, desliza abocanhada. Chora!



Este texto vem de Luso-Poemas
https://www.luso-poemas.net

Pode visualizá-lo seguindo este link:
https://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=6207