Nada em ti me é estranho

Data 25/04/2007 22:51:20 | Tópico: Poemas -> Amor

Nada em ti me é estranho e, contudo,
nunca te vi fisicamente presente.

Nem o cheiro
Nem o tacto, nem o toque
Nem o som tenro e rouco da tua voz
de rio a deslizar-se ávido, da nascente à foz.

Contudo,
Quando a noite se manifesta
no fogo alaranjado - Sol engolido
que se lança ímpio, vertiginoso, lá em baixo
na taça fresca do mar -,
e os astros fatigados finalmente arrefecem,
quando as águas esgotadas se coam
em planuras de pele da pedra, e ela mesma
se queda polida
p'lo silenciamento mudo do próprio sossego,

nesse subliminar momento

É o teu corpo que se aninha felino a meu lado
É a tua boca que se move ávida
na seiva quente da minha boca,
São as tuas mãos, reconhecidamente sábias,
fortes e determinadas, que percorrem
as formas corporizadas do teu próprio sonho.

E que eu sou a videira de saliva e sangue
agilmente curvada, de que exalas o elixir derradeiro.
E tu a flecha incendiária a acordar no fogo
as ervas mais rasteiras.

És meu amor,
o cheiro intenso e prezeiroso da fruta-pão
em espera na fruteira, das magnólias amarelas
a florir no fundo do jardim,
dos canteiros renovados de cidreira e de jasmim.

Tu meu amor, és por fim,
o devaneio debuxado a cores perfeitas e completas,
no parapeito gelado na noite derradeira.

Tu meu amor, és simplesmente a Primavera inteira!

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(corrigido em 2009/09/03)


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