
Não me escrevas palavras indeléveis
Data 01/05/2007 22:09:05 | Tópico: Poemas -> Amor
| Não me escrevas palavras indeléveis fundidas a frio no fundo rolado de um rio sem água para navegar.
Usa-as com exiguidade, com parcimónia total. Escolhe uma a uma de uma abissal floresta. Apenas aquelas que acredites seres capaz de, tal ousado gabiru, em mim fazer voar.
Depois, meu amado, rola o teu corpo nu no lençol bordado, aqui ao lado. Envolve-me no varal da loucura mais arrebatada. Trinca a pele rosada a minha boca aberta com a fúria intempestiva com que molhas a palavra nos dedos da saliva. Desliza de novo, envolve-te no verso do verso e de novo no seu reverso. E de novo no seu começo… Denta por entre meio, a ponta oferta dos meus seios, com a força com que mordes num assobio, uma a uma, bravas ventanias, as que galgam na ousadia as serras que te viram nascer.
Não, não escrevas mais sílabas indeléveis nos vales granizados dos teus e meus pecados.
Abre de vez os braços, abre-os de par em par, deixa-os apenas suspensos nas costumeiras aduelas, que não os quero frinchas estreitadas de janelas. Quero-os vastos de largos, quero-os imensos de longos.
Dá voz aos pássaros dentro de ti povoados, esses, do bico cortado. Dá voz aos seus chilreios… Aos pássaros que te sobem do peito aos ombros, e que se revelam carentes em alvoroçados enleios.
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