Crónica de Uma Sociedade Egoísta

Data 17/02/2009 19:54:13 | Tópico: Crónicas

Não esperes que alguém mude por “outro” alguém. O ser humano é um ser tremendamente egoísta, que só inicia algum processo de mudança se daí advier algum benefício próprio, dado que também, convenhamos, não é fácil deixar o seu tão habitual e conhecido “mundo estável” por algo desconhecido. Mudanças induzidas por intenção alheia, são meramente fictícias, meramente “conquistatórias” ou imbuídas de algum intuito sedutor. O ser humano vive a olhar para o seu próprio umbigo, fazendo dos que o rodeiam, alguns dos quais chama de amigos, passatempos que vão e vêm, num uso descontínuo, em proveito das suas próprias necessidades. O que hoje até pode ter muito interesse e ser algo que de bom grado se quer em nossa vida, amanhã acaba a tornar-se um empecilho, daí que nada mais lógico do que “deitar fora”… Talvez um dia, quando o meu “eu” precisar eu vá buscar à reciclagem. Vivemos num mundo da era rápida e tecnológica, na era da insatisfação, na era dos sentimentos virtuais, das relações despersonalizadas. Vivemos num mundo do instantâneo. O que agora escrevi, passado 2 segundos detecto que foi um erro, não importando, contudo, os sacrificados desse erro; os amigos que me ampararam quando precisei já não são amigos porque não se adequam com os interesses que adquiri neste vai e vêm de mudança que ocorre em função do meu próprio interesse. Tudo o que nos rodeia só pode ser visualizado sob o prisma do benefício próprio, da utilidade pessoal… esqueçam a sociedade, ela é apenas um meio onde seres da mesma espécie têm o azar, ou a sorte, de se cruzar e estabelecer um diálogo de sms que pode evoluir ou não, mais uma vez, em virtude dos meus ganhos pessoais. Há dias de azar, talvez sextas-feiras treze, talvez outro dia qualquer… Perdemos a capacidade de olhar nos olhos, de ver os que nos rodeiam… perdemos o sentimento de pertença… vivemos na era do egocentrismo… somos carrascos e sacrificados da sociedade do “eu”, da ausência de valores, da ausência de destinos… não nos importamos com as vítimas que fazemos em nosso benefício pessoal, basta apenas ignorarmos os que magoamos pelo caminho desta forma eles deixam de povoar a nossa consciência imoral e agnósica. No entanto, sabemos comportarmo-nos como vítimas sós e incompreendidas do mal comum dos que padecem vivências marcantes… aí, não esquecemos o que sofremos, o que nos dói… mas é apenas uma memória temporária, que como sempre acabamos por usar em benefício próprio, como forma de desculpabilizar o nosso comportamento errado, porque afinal fomos vítimas de experiências traumáticas, fomos cobaias de uma sociedade sem escrúpulos, da qual fazemos parte. Não conseguimos usar as experiências vividas como forma de crescimento pessoal, como forma de menos menosprezarmos os habitantes do nosso mundo, ainda que estes possam ser tão temporários como o desejo do nosso capricho egoísta…
O ser humano está a tornar-se a passos largos num caixote de lixo amoral, vive apenas para o fútil, desistiu de investir em si próprio e nos que o rodeiam, vive obcecado com a escalada para a ascensão social, para o consumo imediato que o deixam vazio em poucos segundos…
Falta-nos voltar às origens, à simplicidade das coisas, dos sentimentos… falta-nos dar oportunidades a nós mesmos e aos outros, de agir por um bem comum, de apreciar a beleza das coisas naturais… de desmitificar o culto da beleza artificial, da era do betão, do coquete só porque ficam bem na foto, das relações a troco de nada…
Por isso, queria agradecer àqueles que me permitiram crescer e chegar até aqui, àqueles que mesmo quando o meu egoísmo me “fechou” os olhos e o coração, não desistiram de mim… quero agradecer àqueles para os quais não fui apenas um passatempo ou uma passagem que não foi suficiente para preencher o vazio, quero agradecer porque me permitiram acreditar que há sempre um amanhã melhor se todos juntos nos permitirmos….

17/02/2009

Diana Gomes



Este texto vem de Luso-Poemas
https://www.luso-poemas.net

Pode visualizá-lo seguindo este link:
https://www.luso-poemas.net/modules/news/article.php?storyid=71216