A palavras não se pintam de azul

Data 15/05/2007 22:56:12 | Tópico: Poemas

Um homem de braços abertos,
Grávido de muitas ausências,
Abeirou-se de uma pequena flor
Que descia de uma pincelada ainda húmida.
Pintou, com ela, os dedos incertos
Que lhe saiam das mãos como pontas de amor
E lhe espremiam a essência,
Enquanto batia com a sua poesia
Entre o querer do escritor
E o castrar do censor.

Um homem de braços abertos
Para abraçar o que vier
Deixou-se cair, prostrado
Em chão de pecados certos...
Tão certos como o dano que quer nascer
Das verdades outrora mentiras
Lidas e relidas até serem de todos,
Feitas, assim, de arte obrigatória.

Um homem de braços abertos
Quis-se rendido, de voz curta
Ou vendido, de leitura prostituta
Que fosse vazio e se enchesse num sopro,
Estereotipado, de mãos cortadas
E de pensamento tosco talhado a escopro.

Mas um homem de braços abertos
É esperança que vive e não morre
Em leito de balas, grilhões e ferros...
É poema que renasce e permanece.

Valdevinoxis

Nota de texto: azul era a cor usada pela censura ditatorial em Portugal. A censura também foi alcunhada como "lápis azul".


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