na hora da morte

Data 25/04/2009 10:27:29 | Tópico: Acrósticos

Eu queria ser católico, chamar o padre na hora da morte.
Rosto cavado, mão suave, sem calos, afagava-me dizendo:
Estás perdoado. Que sorte!

E desfaziam-se meus pecados,
Abandonavam o corpo
Saindo pelas pontas dos dedos, aos bocados,
Suavemente, exalando um sopro.
E sentia-me pasmado, feliz, sereno,
no gozo deste leito de morte terreno.

Mas não sou católico, por vaidade!
E vejo os milhões de células, diabinhos
a lutar p’ra viverem em meu corpo, que mesquinhos!
Uns mandam-me à sopa e ao pão, querem manjar…
Outros, sujos e pesados, querem latrina, cagar.

Sinistra realidade!

Sou escravo, cumpro ordens, bem vejo,
de quem comanda meu desejo,
de ser feliz, de dançar e de beber.
E se o que sinto é amor
é que me mandam foder.

Até lhes tenho rancor!

Poetas e artistas rimam que a vida é bela
Não entendo esse rimar.
Se calhar estou farto dela.
Mais belos são montes, rios e ventos,
esses não querem nada, são serenos.
É n´eles que quero estar.

Portanto sosseguem, putas matreiras,
Aqui não há padres nem boas maneiras,
Para onde for vêm comigo.

Nem morrer em paz consigo!




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