
Carta de 1934 ao Ministro da Agricultura
Data 29/05/2009 14:32:18 | Tópico: Poemas -> Humor
| Ao Excelentíssimo Ministro da Agricultura
Exposição
Porque julgamos digna de registo a nossa exposição, senhor Ministro, erguemos até vós, humildemente, uma toada uníssona e plangente em que evitamos o menor deslize e em que damos a razão da nossa crise.
Senhor! Em vão esta província inteira desmoita, lavra, atalha a sementeira, suando até à fralda da camisa. Falta a matéria orgânica precisa na terra, que é delgada e sempre fraca. — A matéria em questão chama-se… Caca.
Precisamos de merda, senhor Soisa! E nunca precisámos de outra coisa.
Se os membros desse ilustre Ministério querem tomar o nosso caso a sério, se é nobre o sentimento que os anima mandem cagar-nos toda a gente em cima dos maninhos torrões de cada herdade. E mijem-nos também por Caridade!
O senhor Oliveira Salazar quando tiver vontade de cagar venha até nós!... Solícito, calado, busque um terreno que estiver lavrado e, como Presidente do Concelho, queira espremer-se até ficar vermelho!
A Nação confiou-lhe os seus destinos? Então comprima, aperte os intestinos. Se lhe falhar um traque, não se importe, quem sabe se cheirá-lo nos dá sorte? Quantos porão as suas esperanças num traque do Ministro das Finanças? E quem viver aflito, sem recursos já não distingue os traques…dos discursos.
Não precisa falar! Tenha a certeza que a nossa maior fonte de riqueza, desde as grandes herdades, às courelas provém da merda que juntarmos nelas.
Precisamos de merda senhor Soisa! E nunca precisámos de outra coisa.
Adubos de potassa?...Cal?...Azote?!?... Tragam-nos merda pura do bispote!
E todos os penicos Portugueses durante, pelo menos, uns seis meses. Sobre o montado, sobre a terra campa, continuamente nos despejem trampa.
Terras alentejanas, terras nuas, desespero de arados e charruas, quem as compre ou arrenda ou quem as herda sente a paixão nostálgica da merda.
Precisamos de merda senhor Soisa! E nunca precisámos de outra coisa.
Ah!... Merda grossa e fina! Merda boa das inúteis retretes de Lisboa!... Como é triste saber que todos vós andais cagando sem pensar em nós!
Se querem fomentar a agricultura mandem vir muita gente com soltura. Nós daremos o trigo em larga escala, pois até no faz de conta a merda rala.
Venham todas as merdas à vontade, não faremos questão de qualidade. Formas normais ou formas esquisitas! E desde o cagalhão, às caganitas, desde a pequena pôia, à grande bosta, de tudo o que vier a gente gosta.
Precisamos de merda senhor Soisa! E nunca precisámos de outra coisa.
Évora, 18 de Fevereiro de 1934
Pela Junta Cooperativa dos Sindicatos Reunidos Do Norte, Centro e Sul do Alentejo
O Presidente, Don Tancredo (o Lavrador).
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