Madrugaste em mim sem ter amanhecido

Data 01/06/2007 22:01:47 | Tópico: Poemas -> Desilusão

Deslizo na tua boca de vigílias agrilhoadas
em espinhos famintos de negras rosas
na dor imposta desta nossa distância.
Bebo do delírio coralino dos teus olhos
o vinho ébrio e o brilho falacioso
de prometidas d’alvoradas.

Viajante de um tempo sem memórias,
em arestas buriladas aos ventos do mutismo,
navegaste o meu corpo de amurada
em auroras despidas de claridade.

No entalhe d’artes emboscadas
falaste-me de ternuras, de sedas fartas,
resguardadas no porão da tua nau, em paliçadas,
e de uma planície alaranjada sucumbida em trilhos
calcorreados no trigo louro de fim do dia.

Cantaste-me a sede do meu corpo
num verbo desvendado, povoado de disfarce,
urdido em cometas e em estrelas diurnas.
Em espíritos fundos de saudade acesa.

Madrugaste em mim sem ter amanhecido
e partiste, ainda a noite respirava dia,
ainda a noite temia sucumbir em agonia
à fragrância sulfúrica do meu corpo
que, solitário,
tesouro não desvendado, ali morria.



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