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Data 19/06/2009 10:35:46 | Tópico: Prosas Poéticas

Nasci
Envolta no barro vermelho desta terra.
Ungiram-me a alma com o pó da desilusão
Que percorre este espaço já sem chão, grito sufocado
De geração em geração, vai passando de mão em mão
Tal como passou o pão, que se esqueceram de semear
Nem os vermes tem mais onde se agarrar
Os pássaros deixaram de voar, as crianças de brincar
Só se ouve o silêncio, que chora baixinho num lamento
Recordando um outro tempo, tempo de luta de disputa
Por um bocado de chão, por um bocado de pão
Alentejo, em decomposição, terra nua de sofreguidão
Paraste, esperaste, cansaste não sonhaste, ou então abandonaste
A tua garra, a tua seiva,
Que foi orgulho de ceifeiras, de peões de mondadeiras
Cavaram as ilusões, que agora
Em tom de laracha, metes debaixo da almofada,
Onde dormes em sobressalto, tudo porque paraste de sonhar alto
Tomaste de assalto, a era do bota abaixo
Desculpa terra sem vida, mas essa eu não encaixo
Assim me cansei de te chorar, talvez me canse de te amar
Nesse dia espalharei a alma, em cinzas sobre o mar
Numa esperança, dorida, de uma vida desiludida
Que o mar, esse
Me saiba escutar, lave este barro, esta sina de te amar.

Antónia Ruivo


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