
13. (de memórias dos sentidos)
Data 20/06/2009 14:59:13 | Tópico: Poemas
| Vem falar-me dos dias em que ainda se faziam amigos Daqueles dias das palmeiras do dendém das bananeiras e coqueiros onde subíamos em eternos desafios de sempre novas brincadeiras
Vem falar-me dos amigos desses dias tão longínquos Dos amigos sem cor desinteressados que então havia Vem falar-me das correrias no areal da praia da Restinga Vem falar-me da Colina do porto do Lobito e do alto da Bela Vista a dominar a cidade Vem falar-me do Compão e de Catumbela também Vem falar-me dos namoros desses dias longínquos que não me falas em vão
Vem falar-me das rebitas no Benfica e no bairro do Kalillongue vem falar-me de Huambo mas fala-me com verdade Das boitas das meninas do Kandumbo das passagens de ano no Atlético dos carnavais no Ferrovia e da farmácia do Martins Vem falar-me disso tudo vem matar-me esta saudade
Das meninas do Operário de Luanda do kizomba sempre a bombar fala-me também do samba e do futebol nos Coqueiros Das cucas bem fresquinhas nas esplanadas da Mutamba e dos velhos machimbombos ou das mariscadas na Ilha
Das acácias floridas nas ruas de Benguela dos poetas desta terra do Cristo-Rei na Huíla e da estrada serpenteante do Leba fala-me também da Chibia Vem falar-me das noites de luar na Fortaleza de Luanda luar mais lindo lua cheia não havia
Vem falar-me das palmeiras dos areais do Mussulo e dos cinemas ao ar livre Do parque do Kissama e das fugas clandestinas para Belas e p´ra Barra do Kwanza Vem falar-me do Miradouro da Lua mais parecido ao insólito doutro qualquer planeta
Vem falar-me disso tudo e dos poetas da minha terra tão ausentes e tão presentes
Da Kissangua na cabaça do pirão e do jindungo do óleo de palma com feijão da muamba com galinha do cheiro do peixe seco que o negro Benedito assava na fogueira entre duas pedras a fazerem de cozinha
Ah e não te esqueças também Vem falar-me da mulata reboliça do seu corpo a roçar-se sob a chita que o cobria tão catita do suor e do cheiro do seu corpo e da esteira em que se deitava já cansada de sono alta noite manhã cedo ao romper do novo dia quando vinha da rebita
Fala-me também da noite que ao fim do dia nascia entre rubros pôr-do-sol que eternamente duravam na linha do horizonte
E das silhuetas desenhadas e de negro pintadas das mulembas e bissapas nesses pôr-do-sol cor do sangue que duravam horas longas noite dentro E dos imbondeiros gigantes que guardavam sumptuosos a lonjura da savana
E das queimadas eternas que tingiam de sangue rubro a cor da terra do rubro pó das picadas
Vem falar-me do olhar das crianças à roda da fogueira ou à entrada da escola dos seus sorrisos nos olhos que sabem falar de esperança Fala-me de tudo isso que agora eu não vejo e tu não vês mas não me fales isso nunca das mortes que a guerra fez
__________ dedicado a dois amigos, angolanos de raça: ao Fernando Barão, de Luanda e ao Diolindo, de Caluquembe de Fernando AAlmeida Reis
|
|