A melhor forma de alguém se agarrar à matéria...

Data 20/06/2009 23:47:56 | Tópico: Crónicas

“O Pai da História”, era a alcunha do professor da disciplina de História do 3º Ano 9ª Turma, da Escola Comercial Patrício Prazeres, em Lisboa, no antigo Vale Escuro. Homem de grandes sentimentos até pelo habitual gesto quando comentava (e incentivava) o quão importante era estudar, colocar os assuntos tratados na aula em dia… “vocês agarrem-se à matéria” e gesticulava com a sua mão (não a víamos, mas só poderia ser ela mesmo…) com enorme pujança no interior de seu bolso, das calças, (questionávamos, com a malandrice da juventude: “Qual seria a matéria a que ele se referia?”). Tinha estudado em Coimbra e era grande defensor das práticas coimbrãs e adepto confesso da Associação Académica de Coimbra, visível aos olhos de todos, até pelo emblema da Académica que usava na lapela do seu casaco (na época o clube dos estudantes tinha um plantel fabuloso, e até ficou, por aqueles anos, num 2º lugar do campeonato (hoje Liga, e agora com nome de bebidas…), e a muitos poucos pontos, creio dois, dos campeões… o Benfica (o F.C.Porto daquele tempo…), nomes como Maló, Gervásio, Curado, Belo, Marques, Simões, os irmãos Campos, Mário e Vítor, Lourenço, Rocha, Crispim, Manuel António, Ernesto, Artur Jorge, Oliveira Duarte, Serafim, e anos antes Bentes e Wilson, entre muitos outros, jamais serão esquecidos pelas hostes negras). Outra particularidade que este homem da cultura fazia transparecer: - visionava as coisas olhando para o lado oposto, era vê-lo sair da escola no seu automóvel fazendo a primeira curva à direita olhando para o lado esquerdo. Mas o facto mais relevante passava-se por ocasião dos testes…havia a tendência de certos alunos tentarem abrir o livro para “extraírem algumas notas”. Se o professor olhasse a sala de frente não havia problema, mas se virasse sua cabeça de lado, lá vinha a observação: “Ó menino, vamos lá a fechar o livrinho!...”Quando dava as suas aulas e dissertava sobre os mais variados temas da História Universal, procurava, no final das mesmas, aos alunos qual deveria ser o sumário. As opiniões iam surgindo e ele fazia as respectivas correcções, indicando sempre a expressão “ponto”, para referenciar o finalizar do período textual e/ou a correspondência à matéria aludida. Certo dia, em que questionava a aula, no habitual sentido de se construir o inerente sumário, ouve-se alguém dizer: “Os Hebreus”... Só? Inquire o professor. Respondo eu: - “Os Hebreus”, ponto.
Logo uma referência a vermelho foi inserida na caderneta de turma, na página referente à minha inscrição de aluno da disciplina.
Seus grandes sentimentos ficaram conhecidos e reconhecidos pela turma aquando do último dia de aulas, do último ano do Curso. Ele pede à turma que abandone a sala, um quarto de hora mais cedo, para poder estar aquele período de tempo a observar os nossos lugares, como se ainda ali permanecesse-mos, para a eternidade…
Ainda hoje, quando se reúnem antigos colegas de escola, daquele tempo, é uma das figuras recordadas, com alguma emoção, o professor Júlio Basto, “O Pai da História”…
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Pequenas crónicas sobre estórias passadas na Escola Comercial Patrício Prazeres há quase quarenta anos...


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